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Opinião
03/06/2014 - 11h00
Os donos do pedaço
Montserrat Martins
 

As periferias têm donos do ir e vir em seus territórios e para conquistar a população estes costumam ser implacáveis com ladrões. No papel de Estado, “defendendo” a comunidade, patrões do tráfico praticam a pena de morte contra a “chinelagem”, que é roubar no próprio território. Por isso, há regiões sob o controle do tráfico em que os moradores vêem o patrão como justo e bem quisto.

O poder local nos territórios, no século XXI, apenas muda de forma quando gangues são substituídas por milícias, como no Rio. Mas a pergunta que não quer calar é: houve época no país em que territórios fossem livres, sem donos? Como diz um post no Facebook, “tirar a Rocinha das mãos dos traficantes é fácil, quero ver é tirar o Maranhão da família Sarney”.

Esse “status quo” remonta ao tempo de Capitanias Hereditárias, ainda no século XVI, o nosso primeiro como colônia. A Coroa portuguesa doava lotes de terra para exploração comercial, o que já havia sido bem sucedido na Ilhas da Madeira e de Cabo Verde. No Brasil o primeiro lote foi a ilha doada a Fernando de Noronha, como veio a ser conhecida a até então Ilha de São João.

Essa cultura política atravessou cinco séculos, chegou ao século XX tendo “donos do pedaço” como o baiano ACM, Antônio Carlos Magalhães. As práticas autoritárias e os agrados “clientelistas” para satisfazer a população se incrustaram nos nossos hábitos. Até hoje você encontra na Bahia saudosos do tempo que “não tinha violência porque a polícia no tempo do ACM não deixava”, quer dizer, mandava matar, daí seu apelido de “Toninho Malvadeza”. Como um patrão do tráfico do século XXI, como um dono de Capitania do século XVI, seu poder era absoluto.

Há trinta anos surgia uma nova força política popular que prometia “varrer” do poder local os Sarney, Collor e Maluf, para citar apenas alguns. Mas nestas três décadas em que essa nova força ascendeu ao governo, os clãs aderiram rapidamente e se reacomodaram, agora lado a lado com os antigos opositores, hoje no poder.

Há muito a aprender com as Capitanias, desde as 15 que foram doadas por Dom João III na costa brasileira entre 1534 e 1536, do rio Amazonas até São Vicente (cidade hoje vizinha de Santos, SP). O sistema de donatários incluía as Capitanias de Maranhão, Ceará, Rio Grande (do Norte), Pernambuco, Baia de Todos os Santos e Espírito Santo, ou seja, nomes que passaram a designar estados, tardiamente. Apenas as de Pernambuco e São Vicente foram bem sucedidas, se diz.

O primeiro Governo-Geral no nosso país foi criado em 1548 para “dar favor e ajuda” aos donatários. Quer dizer, o governo “de todos” favorecer interesses privados remonta ao primeiro governo do país. Foram também instaladas as primeiras Câmaras Municipais, formadas pelos “homens bons”, os proprietários de terras. Ou seja, as Câmaras também tem uma “tradição” a zelar, de terem como “donos” os donos das terras. Características feudais e escravidão não deixavam dúvidas sobre quem estava no comando. A hereditariedade foi extinta formalmente pelo Marquês de Pombal em 1759, mas a denominação de Capitania prosseguiu até o fim destas, em 1821. E os clãs permanecem até hoje, como você sabe.

Nossas gangues que controlam territórios, nossos clãs que garantem “ordem” onde governam, com suas próprias “leis” aceitas culturalmente pela população que os elege, e inclusive as relações submissas do Estado com os “donos” privados do país, todos tem a mesma origem. Seguimos sendo um país de Capitanias Hereditárias.


Nota do Editor: Montserrat Martins, colunista do Portal EcoDebate, é psiquiatra. Fonte: Portal EcoDebate (www.ecodebate.com.br)

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