14/09/2025  18h11
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Opinião
06/04/2005 - 08h12
O oportunismo da falsa lógica
João Nemo - MSM
 

Até a presente data não havia me animado a comentar, diretamente, essa questão do desarmamento. Fui motivado pelo artigo de um jornalista, Luiz Garcia, denominado: O juiz e o Estatuto.

Obviamente não ando armado e, como a maioria das pessoas, sinto certo incômodo com a possibilidade de parecer um apologista das armas ao afirmar o óbvio, ou seja, que essa questão nos foi imposta por alguns ideólogos, outros tantos espertalhões e uma porção de tolos ansiosos por exibir a sua pieguice. Esse tipo de coisa é comum hoje em dia. Em vez de direcionarmos as energias para os problemas que, de fato, incomodam a maioria das pessoas, ficamos todos envolvidos com uma agenda de debates nascida a partir de minorias ativas, persistentes e com acesso privilegiado aos instrumentos de verbalização. O próprio Ministério Público que, supostamente, deveria se dedicar aos tais direitos difusos, não raro prefere abraçar casos que de difusos não têm nada, mas são considerados politicamente interessantes.

No que se refere a armas, raramente converso com alguém que acredite na utilidade do pretendido desarmamento, o que demonstra que, ou a minha amostragem está incrivelmente viciada ou essa coisa não convence ninguém mesmo. Dificilmente se ouvirá comentários sobre a excelência das armas mas, todo mundo sabe, incentivar viúvas a entregar ao governo a velha pistola enferrujada do falecido não ajudará em nada a resolver o nosso problema. Em contrapartida, quando algum defensor oficial do tema começa a argumentar, parte logo de saída, com uma saraivada de acusações, desqualificações, suspeitas e insinuações de motivos torpes que possam estar motivando um possível discordante.

Alguém já disse que "a Estatística é a arte de torturar os números até que eles confessem aquilo que nós desejamos" e essa arte tem sido exercida por ambas as partes nessa discussão mas, com certeza, com muito maior intensidade pelos entusiastas do desarmamento dos inocentes. Digo: por ambas as partes, porque já li negativas a respeito do fato de que se morre mais no Brasil por armas de fogo do que por acidentes de trânsito, e isso é um fato. Não é preciso "tratar" os números. O coeficiente de óbitos por cem mil habitantes determinado pelos homicídios chega a mais de duas vezes o de acidentes de trânsito no Estado de São Paulo, o que é, absolutamente, incrível. A maioria dos homicídios é por arma de fogo e isto, por sua vez, é inteiramente óbvio e esperado, considerando que estamos em 2005 e passou o tempo do arco e flecha, das zarabatanas, lanças e espadas mas, também, ainda não chegamos à era das pistolas laser da guerra nas estrelas. Uma boa pergunta seria: quantos desses homicídios são cometidos por indivíduos usando armas legalizadas, carregando uma licença no bolso? Fico imaginando uma cena de comédia em que o pistoleiro, um neurótico-obsessivo, afirma: "vou ter que adiar a encomenda do fulano, porque esqueci o meu porte em casa".

Há muitos anos atrás, trabalhando à noite, pensei em carregar uma arma e perguntei a um velho policial se teria que ser registrada. Ele me aconselhou a ter uma registrada, mas usar mesmo outra sem registro. Acabei decidindo não usar nenhuma. Mas me incomoda o fato do Estado se dar a prerrogativa de ser, ao mesmo tempo, tão incompetente para deter os criminosos e tão agressivo em ameaçar o cidadão comum e inocente. Alertar para os riscos inerentes de possuir uma arma, sobre a necessidade de preparo para usá-la e a improbabilidade de uso defensivo eficaz na maioria das situações, é um dever de orientação e esclarecimento. Porém, se o direito à legítima defesa não foi abolido, não faz sentido vedar ao cidadão os meios materiais mínimos para faze-lo. Evitar reações, particularmente de forma precipitada a assaltos, pode ser um bom conselho de prudência, mas há limites a partir dos quais um homem, ou mulher, pode achar que é preciso arriscar a vida. Esse limite é uma escolha pessoal, intransferível, e não pode ser seqüestrada por bem protegidos membros da classe política, ansiosos por exibir bom-mocismo e sintonia com as teses politicamente corretas.

Na ansiedade de "sacar mais rápido" no mundo das comunicações, já temos defensores desse desarmamento ilegítimo anunciando que os homicídios começaram a cair graças ao recolhimento das garruchas. Não sei se é burrice ou descaramento, porque mesmo que essa coisa funcionasse, o tempo de carência entre a iniciativa e os resultados, certamente, não seria tão curto e nem dispomos de estatísticas consolidadas com tamanha precisão e agilidade. Vamos acabar concluindo que quem andava matando era esse pessoal ansioso por trocar o velho revolver por qualquer cem "mirréis". Mas esse tempo acelerado não é coisa de se admirar, considerando que alguns meses depois de empossado, este governo já comemorava como mérito seu uma magnífica safra agrícola. Não me refiro ao ministro, é claro, que não é idiota, mas há outros no governo que acreditam, piamente, que nós somos.

Contrariando os números dos "pacíficos", há uma enxurrada que evidências de que a simples posse de armas nada tem a ver com o nível de violência. Basta verificar que países europeus com altos índices conhecidos de armas por domicílio - legalizadas, portanto - têm, comparativamente, baixa incidência de homicídios. É o caso de França, Suíça e outros. A comparação interestadual nos Estados Unidos levaria, curiosamente, à conclusão estranha de que quanto mais armas menos homicídios, pois, apesar da "síndrome do atirador maluco", regiões de alta densidade de armas são, freqüentemente, de baixa ocorrência de crimes. Há quem defenda a tese de que isso se deve a um efeito "protetor" das armas. Pessoalmente, creio que também não é uma conclusão correta, pois esse fenômeno, muito provavelmente, está mais ligado a fatores de outra natureza, intervenientes como, por exemplo, o provincianismo das regiões mais armadas. Há referência até a um Condado onde a lei obriga todo pai de família a registrar uma arma em seu nome e, curiosamente, o último homicídio ocorrido tem uns 15 ou 20 anos. Não deixa de ser um "case" interessante e embora não seja uma experiência para ser transplantada, ajuda a desmoralizar a idéia de que a existência de armas é a determinante dos crimes. Provavelmente, em algumas circunstâncias, possa mesmo ser inibidora deles, já que os potenciais predadores sabem que as "presas" também têm dentes.

Quando o jornalista a que me referi no início afirma: - "Não existe prova mais eloqüente das virtudes do desarmamento do que o assassinato, a sangue-frio e por motivo cretino, de um vigia de supermercado pelo juiz cearense Pedro Percy" - tenta ser oportunista e exercita uma falsa lógica, porque seria fácil, também, dizer exatamente o contrário. Note-se, que não se trata de um juiz de futebol mas de um magistrado, um "meritíssimo" do nosso judiciário a quem jamais, repito, jamais lei alguma vai impedir de dispor de uma arma para sua proteção. O advogado do diabo, portanto, perguntaria: será que se o vigilante assassinado estivesse portando uma arma na cintura o ilustre pistoleiro teria ido ao encontro dele para bater-se a tiros? A única coisa que o triste episódio prova é que alguém pode ser, ao mesmo tempo, juiz de direito e assassino por motivos fúteis.

Logo no início do seu texto o jornalista afirma também: "Há notícias de que o entusiasmo despertado pelo Estatuto do Desarmamento está murchando" Não sei onde ele colhe essas notícias, mas esse tal entusiasmo jamais existiu a não ser para os previamente entusiasmados. Houve, sim, constrangimento. As mesmas pessoas que em particular acham a coisa uma tremenda bobagem, não repetem a opinião no jornal ou na TV com receio de parecerem insensíveis, amantes de armas ou, pior, "lobistas" dos interesses escusos da indústria armamentista.

A última questão é a seguinte: vale a pena tomar posição contra o tal Estatuto do Desarmamento? E, lamentavelmente, a resposta incômoda é sim. As razões são tanto conjunturais como derivadas da natureza das relações entre cidadão e Estado.

- Há uma perda absurda de foco em relação ao problema da criminalidade. Nada, jamais, foi tão parecido com aquela anedota do marido traído que optou por remover o sofá de que a adúltera se valia. O número de portes de arma emitidos decresceu a números insignificantes na ultima década, enquanto as taxas de homicídios explodiam.

- Uma legislação mais sábia deveria distinguir drasticamente entre o porte de uma arma legalizada que, pelas regras brasileiras, sempre teve seu uso restrito, e o porte de uma arma irregular ou, pior, com identificação raspada. O primeiro caso, obedecidas as restrições apropriadas, não deve constituir crime, enquanto o segundo permite, claramente, a presunção de uma intenção criminosa.

- O Estado não poderia ter o direito de privar o cidadão de meios materiais de defesa mesmo que oferecesse uma proteção razoável, o que está longe de ser o nosso caso. Baixar regrinhas que tornam a simples posse de uma arma inafiançável, enquanto é possível responder por um ou mais assassinatos em liberdade - e se for menor nem responder - é uma insanidade difícil de compreender.

- Finalmente, é preciso dar-se conta do quanto esse tipo de coisas agride os direitos individuais. Existe uma relação inversa entre o grau de responsabilidade pessoal e a intensidade dos controles, e essa relação merece um balanço cuidadoso na vida em sociedade. Alimentar a impunidade e tentar barrar os atos indesejáveis através da hipertrofia dos controles preventivos é ineficaz, sacrifica o cidadão de bem com restrições e ônus exagerados e, praticamente, não afeta o malfeitor. Na verdade, tende a criar um ambiente mais propício para estes que, como parte da sua qualificação de transgressores, aperfeiçoam-se na arte de burlar normas e obter lucros e vantagens com isso.

- Os entusiastas da proibição integral de armas ainda não ficaram satisfeitos, mas lutam para manter a cunha que introduziram nessa questão. Quando a simples posse de uma arma, mesmo guardada em casa, for um crime, será que uma denúncia a esse respeito autorizará um mandato de busca e apreensão, reduzindo a nada ou quase nada a inviolabilidade do domicílio?

Em resumo, como já disse alguém, é bom tomar cuidado com o governo porque ele é perigoso e anda armado. Ele e também os injustiçados deste mundo, ou seja, os bandidos e malfeitores. Para nós, as doces criaturas que pregam o desarmamento total, recomendam recorrer ao "diálogo". Além de tudo, temos que ser bons de conversa e torcer para o bandido estar a fim de um papo.


Nota do Editor: João de Oliveira Nemo é Sociólogo e Consultor de Empresas em Desenvolvimento Gerencial.

PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "OPINIÃO"Índice das publicações sobre "OPINIÃO"
31/12/2022 - 07h25 Pacificação nacional, o objetivo maior
30/12/2022 - 05h39 A destruição das nações
29/12/2022 - 06h35 A salvação pela mão grande do Estado?
28/12/2022 - 06h41 A guinada na privatização do Porto de Santos
27/12/2022 - 07h38 Tecnologia e o sequestro do livre arbítrio humano
26/12/2022 - 07h46 Tudo passa, mas a Nação continua, sempre...
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.