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Opinião
01/08/2014 - 07h02
Por que ainda ler a literatura brasileira?
Rodrigo Franklin de Sousa
 

O mundo contemporâneo nos colocou em uma relação paradoxal com a palavra escrita. Novas tecnologias de comunicação, as mídias, as redes sociais, nos põe em um contato constante com textos dos mais diversos. Talvez nunca na história humana a leitura e a escrita tenham sido uma parte tão presente da nossa vida. Apesar disso, parece que nunca tivemos tão pouco tempo para ler devagar, para ler por prazer, especialmente aquilo que podemos chamar de boa literatura.

Diante dessa situação é natural que façamos a pergunta: – Para que serve a literatura? Isso porque vivemos em um mundo onde as coisas precisam de alguma utilidade para ter valor. Uma reação a esse pragmatismo seria dizer que a literatura tem valor intrínseco e não precisa de justificativa – o que seria verdade.

Mesmo assim, podemos elencar elementos que fazem com que a literatura tenha enorme importância para além do prazer que proporciona.

Talvez o benefício mais elementar da literatura seja a forma como ela nos conecta com nossa própria humanidade. Se algum sentimento importante foi vivido, se algum dilema moral foi enfrentado, se algum conflito existencial atormentou a alma, essa experiência foi capturada em algum texto literário. Na literatura encontramos elementos de nossa humanidade comum. Sonhos, desejos, alegrias, perdas, paixões, virtudes e vícios em que nos vemos refletidos, desfilam nas páginas dos clássicos, como Homero e Cícero, dos grandes nomes, como Shakespeare, Cervantes, Goethe, Dostoiévski, da literatura contemporânea, de Jennifer Egan a Orhan Pamuk, de Moshin Hamid a Gcina Mhlophe, de Chimamanda Adichie a Amos Oz. Dos mais primários impulsos individuais às mais complexas situações sociais e políticas, autores tão diversos compartilham temas e palavras que nos encantam, desafiam e transformam. Antes de mais nada, a literatura nos humaniza.

Por outro lado, sabemos que mesmo partilhando uma natureza comum, não existem humanos genéricos. A experiência humana é construída dentro de uma realidade cultural, histórica e social específica, e assim a humanidade refletida na literatura sempre vai ser marcada pelas especificidades de períodos, culturas, línguas, gêneros, e estilos pessoais distintos.

E por refletir a humanidade nessas limitações, a literatura também sempre foi central na formação de língua e na construção de uma identidade linguística e cultural.

A grande literatura brasileira tem esse papel essencial de nos colocar de frente com o potencial de nossa língua, com a riqueza de nossa cultura, com nossas sensibilidades, com nossos lados sublimes e canhestros.

Tivemos o infortúnio de perder três nomes significativos de nossa literatura no espaço de apenas uma semana: João Ubaldo Ribeiro, Rubem Alves e Ariano Suassuna (sem falar no nosso vizinho Gabriel García Marquez que partiu há tão pouco tempo). Cada um a seu jeito nos ajudou a viver e a experimentar nossa brasilidade de forma mais rica e profunda. Há o que se ganhar e aprender com a visão cosmopolita e acadêmica de João Ubaldo, com o lirismo simples, bonito e quase piegas de Rubem, com o humor, a precisão técnica e o nacionalismo radical e ufanista de Ariano.

Vão-se os autores, felizmente, ficam suas obras. Ficam também muitos outros autores e obras que nos abrem as vistas: Machado de Assis, Guimarães Rosa, Rachel de Queiróz, Adélia Prado, Chico Buarque, Luiz Vilela, Francisco Dantas, Milton Hatoum.

É importante ler os nossos clássicos e os nossos contemporâneos. Mergulhar nesses textos é mergulhar em nossa língua, em nossa brasilidade. E é também possibilitar que toda essa herança tão rica continue viva, nos moldando e sendo moldada por nós.


Nota do Editor: Rodrigo Franklin de Sousa é doutor em Letras pela University of Cambridge (Reino Unido – 2008) e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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