[I] Quando garoto gostava muito de ir ao circo. Achava o maior barato! Admirava a coragem dos trapezistas, a desenvoltura dos malabaristas, o destemor dos domadores de feras e, principalmente, a graça inocente dos palhaços que desjeitosamente invadiam o picadeiro com suas travessuras. Nesses idos, sempre ouvia um e outro dizer que o palhaço era uma figura triste, que o sorriso do jocoso homem maquiado e de nariz vermelho era melancólico. Quando menino, confesso, não entendia a razão de declarações como essa. Hoje, após sentir os golpes de Cronos em minha carne, compreendo a melancolia do homem que se fantasia de louco para diversão da patuleia. E como compreendo. [II] Levar qualquer coisa a sério num país onde praticamente nada é encarado por esse viés é uma tarefa inglória. Num país onde quase todo mundo quer se dar bem ou, ao menos, não ser mal visto por outrem, ousar agir de maneira descente não é apenas uma esquisitice. É uma ofensa. Enfim, numa terra onde, dum modo geral, as pessoas informam-se apenas para ter assunto pra prosear e não para realmente conhecer, qualquer um que tenha a petulância de realizar a segunda opção estará pedindo para ser condenando ao dissabor do ostracismo em meio a multidão. [III] Ter opinião sobre tudo é um claro sinal de que não se sabe patavina de nada. Ter opinião sobre praticamente nada é uma demonstração dum sincero desejo de querer saber algo sobre alguma coisa. Agora, manter-se sempre calado apenas denuncia um medo inconfesso de ser tachado de louco pelos insanos que vivem fazendo posse de esclarecido e que, na real, não sabem nada. [IV] Estamos todos em franca decadência. Só não percebe isso quem já realizou-se plenamente em sua decrepitude. [V] Tenho calafrios quando ouço alguém falar em “cultura”, sobre sua importância. Tais irritações ocorrem-me porque, em regra, quem muito fala nela, na tal da “cultura”, não sabe o que isso, não tem o menor interesse nela e morre de raiva de todo aquele que realmente tenha amor por ela.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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