Convivemos diariamente com a violência. Não apenas a violência noticiada nos jornais, mas aquela em pequena escala que aprendemos a tolerar, até não percebê-la mais. A violência da linguagem e do pensamento que se volta aos nossos próximos e a nós mesmos. Porém, de que adianta sabermos disso e continuarmos vivendo de acordo com a violência? Seria possível encontrar alguma forma de interromper esse “jeito violento de ser”? A partir da prática psicológica, podemos dizer que essa não é uma mudança simples: perceber-se influenciado por uma cultura e reagir de forma consciente, mudando a si mesmo e o meio em que habita parece um desafio para a vida toda. O ser humano, no entanto, é cheio de surpresas e, quando menos esperamos, ele encontra uma forma de se superar. Inspirado em pensadores marcantes como Mahatma Gandhi, Carl Rogers e Paulo Freire, o psicólogo estadunidense Marshall Rosenberg iniciou em 1963 o desenvolvimento da Comunicação Não-Violenta (CNV). Com essa proposta, ele possibilitou a identificação e a interrupção do ciclo da violência do qual participamos sem perceber e sem desejar. A comunicação é o que une as pessoas. Por isso, se ela pode ser violenta, ela também é capaz de nos conduzir a uma profunda reflexão sobre nós mesmos, nossos sentimentos e necessidades. É dessa forma que podemos desenvolver a capacidade de perceber o que as pessoas sentem e quais suas necessidades, mesmo que comuniquem isso de maneira agressiva. Assim, podemos expressar essa percepção, sem reagir com violência e sem deixar de ser sinceros. Na técnica da CNV, a chave da mudança é a consciência de seus próprios sentimentos e necessidades, e a percepção dos sentimentos e necessidades do outro através da empatia (colocar-se no lugar do outro). Depois dessa constatação, Marshall desenvolveu formas de comunicar ao outro o que ambos sentem, do que precisam e o que podem fazer para que a situação conflituosa se resolva da melhor forma possível. A CNV teve repercussão mundial. No Brasil, tem se estabelecido na área social e no meio jurídico. Ela é útil na mediação de conflitos, impedindo que casos de desentendimento de partes se tornem processos formais. Tornou-se, assim, uma forte aliada da Justiça Restaurativa, cujo objetivo vai além de punir o criminoso, buscando reparar e restaurar as consequências do crime. A intenção é que não haja reincidência devido à possibilidade de uma transformação verdadeira dos envolvidos. Após prestar várias consultorias a escolas, empresas e instituições em geral, Marshall B. Rosenberg fundou, em 1984, o Centro para a Comunicação Não-Violenta (CNVC) e passou a participar de situações extremas em diversos países do mundo. Trabalhou e treinou pessoas para trabalhar com refugiados de guerra, vítimas de violência doméstica, prisioneiros, agressores condenados pela justiça, membros de gangues e participantes de conflitos armados. Marshall sempre agiu em busca de uma paz verdadeira, que não exclui as necessidades e sentimentos de nenhum dos envolvidos. Marshall B. Rosenberg faleceu, aos 80 anos, no último dia 7 de fevereiro. Ao seu trabalho, ao seu ensinamento e à sua vida só podemos deixar hoje o nosso muito obrigado. Descanse em paz. Nota do Editor: André Roberto Ribeiro Torres é professor do curso de Psicologia da Faculdade Anhanguera de Campinas – Taquaral.
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