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SEÇÃO
Crônicas
28/04/2005 - 18h30
Lançamento de livro
Chico Guil - Agência Carta Maior
 

Eu queria viajar
para o nada, para o sempre,
para o todo absoluto,
onde em vácuo existisse
como forma cristalina
de uma percepção.

Minha opção seria uma cerveja, pura e simplesmente assim, gelada, como deve ser, como o vulgo pede às três da tarde de um sábado mormacento.

- Veja aí uma trincando, garçom!

A garrafa gorgoleja, o líquido dourado de bolhas e espuma contrasta o horizonte marítimo, os lábios tocando a borda do copo, passando pela língua, preenchendo a boca, gelando o calor de sangue na descida da garganta o sabor da saciedade... ahhh!

De olhos fechados absorvo quanto posso, e quando ao fim o amargor trava o desejo, abro os olhos para o mar aberto, o azul celeste brilhando feito miríades de diamantes enquanto no pequeno recinto abaulado do meu cérebro um sinal de alerta marca a divisa entre o deserto e o mais puro contentamento. Estar ao sol, à beira mar, o sabor da cerveja amargando as últimas papilas da língua, e no bolso da bermuda, sereno, plácido cartão de crédito guarda todos os meus milhões. Ao fim da tarde haverá camarão pistola e vinho, e para terminar um show de violão flamenco na sala seleta de homens e mulheres absolutamente culturais.

Quando passo no saguão do anfiteatro, nem à imagem indagadora que vejo refletida no espelho dou satisfações de meus usufrutos. Sou um desses deuses modernos, a quem os servos acatam e promovem, sendo sua satisfação o sorriso que traduzo ao esfacelar suas iguarias. Na última sessão trouxeram maçãs recheadas com leite condensado, e depois assadas ao fogo lento, até soltar o sumo, a porra doce, o buquê, o fino sabor espargido de minúsculos grãos de cravo e canela.

A plenitude é o desejo sobejamente saciado, e a consciência dele flutuante em um mar de rosas e perfumes.

E agora uma cerveja ao sol ao mar infinito, servem-me camarões, arroz, feijão, o aroma de cozinha, o tilintar dos pratos, o cheiro de sabão, os escravos no corredor, a água no balde, a faxineira começa a varrer a entrada da sala de aula, enquanto tento explicar a trinta e sete adolescentes como foi que escrevi este livro, aprendendo primeiro a dignificar e a significar os sentimentos, depois penetrando as dores da minha raça sagrada, descobrindo compensações para a ausência do céu, sendo atacado até a medula dos ossos e sentindo-os derreter a cada dia, buscando conspiradores que me dessem guarida, preparando com eles as fórmulas impraticáveis contra os venenos da civilização, com um único desejo de não sentir mais as dores da humanidade, para poder estar a céu aberto, de frente para o mar, batendo o vento no rosto, a delicadeza dos cabelos nas orelhas, fluindo em goles pequenos o sabor puro e simples de uma cerveja gelada.

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