Todos nós, de um modo ou de outro, temos de lidar durante a vida com o peso da herança imaterial que nossos Maiores nos legam. De um lado, há os casos de pais desconhecidos, omissos ou fracassados, que inevitavelmente deixam no indivíduo um fardo a ser carregado por muito tempo: alguns, livram-se bem, outros, nem tanto. Por outro lado, existe o desafio, às vezes impressionante, de legados e exemplos altamente positivos, que são sempre estimulantes, mas que podem eventualmente gerar desvios de caminho ou esforços maiores para que a pessoa encontre o próprio rumo, supere comparações, cobranças, e administre corretamente sua própria individualidade. Talvez uma tendência dos filhos homens seja a de superar os pais ou, ao menos, de corresponder-lhes às expectativas. Cresci num tempo em que os pais ainda tinham alguma autoridade sobre os filhos, mas, eles, coitados, eram frutos de uma era de império paterno, por melhores que fossem seus Maiores. Sim, tive muitos conflitos com meu pai, por razões de mudança dos tempos e de temperamento. Talvez, tenhamos rivalizado, mas creio que soube observar sua palavra básica de orientação, além do fato de gostar e de sentir muito orgulho dele. Hoje, maduro, posso reconhecer tranquilamente que não o superei nas façanhas de vida e de profissão, mas tenho certeza de que ele admirava meu arrojo e os feitos que consegui alcançar em vários planos, desde muito jovem. Não sei se ele esperava mais de mim ou se era estratégia para me estimular a crescer, mas agora, tantos anos passados, creio que o peso da sua herança é levíssimo e praticamente desaparece em face da modernidade, com seus valores, exigências, oferendas e perspectivas. Talvez pensasse e agisse como eu, características à parte. De qualquer modo, não dá para negar que esta coisa toda deve ter funcionado como um espectro onipresente em minha trajetória, acredito, afinal, que de efeito mais positivo do que negativo. Vejam, portanto, a importância da carga cultural e afetiva que a paternidade implica e da qual não são todos que se dão conta, na justa medida.
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