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– Gente, o portal tá nas últimas. Ontem foram dois acessos. Eu disse dois. E um deles foi meu, que entrei pra ver como estava a audiência. – Tás brincando. Tá feia assim a situação? – Tive uma idéia: e se cada um for pra sua casa e ficar acessando sem parar o site? Entra, sai e acessa de novo, entra, sai e acessa... o dia inteiro. Pedimos pros amigos e vizinhos fazerem o mesmo. Pensa bem, teremos milhares de cliques por dia. Podemos mostrar as fantásticas estatísticas para os potenciais anunciantes e então... – Sei, e sair do atoleiro. Deixa de ser idiota. Dá pra ver pelos IPs que os acessos todos vêm de meia dúzia de computadores, a concorrência vai descobrir a tramóia. – Amigos, acho que a solução não é por aí. E se a gente forjasse anúncios? – Como assim? – Fácil. Vamos encher a home page de banners e janelas pop-up da Coca-Cola, Banco do Brasil, Petrobras, Extra, Nike, Submarino. Só peso-pesado, coisa grande mesmo. Já pensou a gente mostrando nossa home pro seu Antenor da padoca? O mão-de-vaca vai ficar impressionado com a categoria dos anunciantes, vai querer anunciar também, pode apostar. E ainda vai achar baratinha a nossa tabela... – Mas isso é fraude, cara. – Depende do ponto de vista. Eu chamaria de manobra emergencial de sobrevivência. Se alguma dessas marcas partir pra cima da gente, falamos que foi uma cortesia do portal. O que eles têm a perder com isso? Depois tem outra: os caras não vão nem ver, o nosso site é regional... – É, e bota regional nisso. Eu diria regionalíssimo. – Tudo bem, com esse cambalacho aí a gente pode até conseguir uns anúncios da Quitanda Fruta Fresca, a Loja do China, o Bezerrão no Espeto... – E a padoca, né. – É, e a padoca. Mas isso não resolve o problema da audiência, pessoal. – Sou contra tudo isso aí que vocês estão falando. Nada de se rebaixar, nós vamos sair dessa de cabeça erguida. É só uma crise transitória, isso acontece nas melhores holdings e nosso portal não é exceção. – Bom, pra começo de conversa, portal é modo de dizer, né. Essa bodega é malemá um sitezinho. Quase um blog, pra falar a verdade. – E se a gente for honesto? É, honesto pra caramba, contando tudo o que tá acontecendo e apelando pra solidariedade humana. Vamos colocar um comunicado na página principal, dizendo que somos pais de família, que a situação tá preta e que se continuar assim a gente fecha as portas. Quer dizer, o portal. – Tá, mas quem é que vai ler isso? Esqueceu que a gente não tem visitação, ô esperto?! – Ichi... Então vamos pro jornal. Fazemos uma carta aberta e publicamos na Tribuna de Cidadópolis. Se ficar muito caro a gente cola umas cópias da carta nos postes da praça, pronto. – Que situação. Fico imaginando se alguém descobre que o grande portal da cidade funciona aqui, nesse banheirinho de empregada! – E a gente ainda tem a cara de pau de inventar expediente, sucursais, representação comercial, correspondentes internacionais... – Spam, meu povo. Vamos mandar spam pra cidade inteira falando das novidades que estão sendo implementadas. A Gata do Mês, Classificados com Resultados, Namoro on Line, Flashs da Night, cupons de desconto, essas coisas. – E a lista dos e-mails, onde é que a gente arruma? – Por 750 mangos tá na nossa mão. Tem um camarada meu... – Ah, boa essa. Se a gente tivesse essa grana acertava os 14 meses de atraso com o provedor. – É, amigos. Sendo assim, coloco à venda minhas cotas de participação na sociedade. – Eu também. – Eu também. – Eu também. – Eu também. – Espera aí, e aquele cara que acessou ontem, hein? – Que é que tem ele? – Não se interessa não?
Nota do Editor: Marcelo Pirajá Sguassábia é redator publicitário em Campinas (SP), beatlemaníaco empedernido e adora livros e filmes que tratem sobre viagens no tempo. É colaborador do jornal O Municipio, de São João da Boa Vista, e tem coluna em diversas revistas eletrônicas.
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