— Pai... — Fala, Lipe... — Eu escutei cê conversando com a mamãe... — Escutou? — É... Sobre fazer jejum. Como é isso, pai? — Lipe, o jejum é um sacrifício... — Como assim? — Ah, filho, tem gente que deixa de comer o que gosta. Fica só a pão e água. — Hum... E aí? — Aí, oferece o sacrifício a Deus, pedindo ou agradecendo por alguma coisa... — Ah, tô entendendo... — Pois é, filho... Na nossa religião a gente faz assim. — Cê faz jejum, pai? — Faço. Faço sempre. — Me conta um. — Cê sabe que papai ama pimenta, né? — É, todo dia cê põe um monte no prato... — Então... Nesta semana o papai não vai comer pimenta. — Por causa do jejum? — Isso! Por causa do jejum! — A mamãe também? — Também, Lipe. Só que a mamãe vai ficar sem cafezinho... — Hum! Ela toma cafezinho o dia inteiro! — Pois é, filhote, esse vai ser o jejum da mamãe. — Pai, o que cês tão querendo de Deus? — A gente quer agradecer, filho... Agradecer por nossa casinha. O papai agora não paga mais aluguel. — Ah, isso é bom! Vai sobrar mais dinheirinho! — Isso mesmo, filho! — Pai, eu também quero jejuar... — Ah, não precisa, filho, cê ainda é criança. — Mas, quero assim mesmo! — Deixa você crescer mais um tiquinho e aí... — Não. Eu quero jejuar, sim. Para agradecer o Playstation que ganhei... — Ah, o Playstation... — Isso! E meu jejum vai ser pra sempre! — Pra sempre? Como assim, Lipe? — A partir de hoje vou fazer jejum de beterraba! — Felipe!
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