Nos últimos dias tomei quatro vôos diferentes. Como todos sabem, em cada vôo há uma tripulação específica: comandante, co-piloto, comissário(a) chefe e comissários(as). Os aviões costumam ter, pelo menos, duas classes: executiva e econômica. Nos vôos mais longos, pode haver uma primeira classe. O que distingue essa categorização é o maior tamanho da poltrona, uma tênue cortina que a separa dos demais e o serviço que inclui, nas classes primeira e executiva, bebidas alcoólicas e um cardápio que permite opções nas refeições. Essa tentativa didática, e talvez até dispensável, é para chamar a atenção do que está acontecendo, além do que já se sabe, com a aviação comercial brasileira. A crise é bem mais profunda do que o concernente à qualidade do assento e da alimentação servida. E, sobre ela, já falaram tantos. Até agora, nenhuma solução foi encontrada. As dívidas aumentam, empresas fecham, outras devolvem aviões etc. Não tenho a solução para a crise, pois esse assunto arrasta-se há anos e parece que políticos que voam muito, sempre acenam com prováveis saídas. Que venham. O que me preocupou nestes últimos quatro vôos foi a apatia, uma espécie velada de tristeza, das tripulações. Fazem o serviço seguindo o manual. Teoricamente são polidos, mas está faltando alegria no ato de trabalhar dos aeronautas. Cumprem a obrigação, mas sem amor. E o que digo não é obrigado a ser verdade, mas tento errar o menos possível. Em um desses vôos, procurei conversar com uma comissária e perguntei por que ela estava visivelmente triste. Foi o bastante para que uma torrente de afirmações saísse. Primeira queixa dela: estava trabalhando em escala apertada, em face das demissões na empresa para diminuir custos. Segunda queixa: não sabia até quando continuaria a trabalhar. Temia uma estafa ou receber o aviso prévio. No mesmo instante pensei nos pilotos na cabine, aqueles a quem são entregues os sofisticados aviões de hoje em dia e no pessoal da manutenção em terra, a quem cumpre checar se tudo está certo antes da decolagem. Na história da aviação comercial, há exemplos claros de erros humanos que causaram a morte de muita gente, mas essas falhas poderiam ser minimizadas se a tripulação estivesse trabalhando com a cabeça tranqüila e descansada. Bem que o Departamento de Aviação Civil, sabedor de tudo isso, poderia olhar logo o lado humano da crise, antes da solução financeira, se é que vai haver.
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