Recebi carta de uma telespectadora fazendo-me severas críticas por haver incluído em meu site pessoal (www.puggina.org) uma coletânea que considero bastante completa das "pérolas" presidenciais. Elas formam farto colar que provavelmente terá várias voltas até o final do ano que vem. Segundo a referida senhora eu estaria prejudicando a boa imagem do presidente da República. A situação é muito comum. A pessoa constrói um paradoxo e pensa que inventou um argumento ou formulou uma acusação. Ela pegou papel, caneta, e deu-se ao trabalho de escrever duas páginas com o intuito de inculpar-me por prejudicar o presidente ao reproduzir fragmentos de seus discursos. Em outras palavras: tais pérolas danificariam o cartaz de Lula não porque ele as profira, mas porque as recolho. Ou ainda, a seu juízo: o chefe de Estado brasileiro, cercado por jornalistas de sua confiança, corre o mundo a desfiar disparates e os culpados pelo efeito disso em sua imagem somos eu e meu sitezinho aqui em Porto Alegre. A essas alturas fico na dúvida sobre se devo ou não enfiar no colar a frase com que o presidente atribuiu os altos juros ao comodismo dos brasileiros que reclamam na mesa do bar mas não levantam o assento do banco para procurar taxas menores. Como ficará a imagem do presidente se eu fizer isso? Devo proceder assim em relação a esse homem sensato, que só abre a boca quando tem certeza? Não estaria prestando melhor serviço à pátria se me convertesse em zelador da magda, digo, magna figura presidencial e me unisse aos 60% dos brasileiros que estão satisfeitos da vida e orgulhosos do estadista que elegeram? Cito a carta e o fato para mostrar que há um vasto setor da esquerda profundamente desconfortável com a democracia. Usam-na como escudo para malévolas intenções. Discursam em seu favor, mas exaltam o papel de tiranos como Fidel e tiranetes como Hugo Chávez. Hoje estão com Lula porque não há nada à sua esquerda qualificado para o horizonte sucessório. E como estão com Lula se aborrecem com toda crítica, mesmo quando ela não passa de mera reprodução do que ele diz. Se pudessem, fariam como Hugo Chávez, a quem aplaudiram em delírio quando aqui esteve durante o Fórum Social Mundial: poriam na cadeia quem se atrevesse a criticar os seus. E controlariam a imprensa como a controlam em Cuba, onde, em 46 anos nenhum jornal publicou uma única linha ou entrelinha que pudesse desagradar o ditador. Nota do Editor: Percival Puggina é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.
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