Comunidade: (lat communitate) 1 Qualidade daquilo que é comum; comunhão. 2 Participação em comum; sociedade. 3 Sociol. Agremiação de indivíduos que vivem em comum ou têm os mesmos interesses e ideais políticos, religiosos etc. 4 Lugar onde residem esses indivíduos. 5 Comuna. 6 Totalidade dos cidadãos de um país, o Estado. Teremos nós os mesmos interesses, ideais políticos, religiosos? Há alguma comunidade, alguma comunhão, alguma coisa que podemos dizer, partilhamos? Não há mais raízes, nada está atado ao solo, solo este em que nascemos - aqui refiro-me aos ubatubanos - e que por isso deveria fazer que partilhássemos algo em comum. Que raízes se agarram? Perguntaria o poeta.
Quando Ubatuba era menor, ou mesmo nos anos 70, havia algo em comum entre seus habitantes. Todos de uma maneira ou outra se conheciam, conheciam as famílias de onde nos originávamos. Havendo a família, ou famílias, conseqüentemente, a própria sociedade em que vivíamos tomava conta de seus filhos, ou cidadãos, como quiserem. Você poderia sair e deixar sua bicicleta pelo centro da cidade sem necessidade de prendê-la, amarrá-la, acorrentá-la. A bicicleta ficava lá a espera do legítimo dono. Minha mãe esqueceu a bicicleta na Câmara Municipal. No dia seguinte foram avisá-la que a bicicleta estava lá. Meu amigo Betinho (Herbert Luna Marques) era useiro e vezeiro em estacionar o carro de qualquer maneira e sempre deixando-o com porta ou vidros abertos, às vezes quase no meio da rua. Ele sabia, sabíamos, que ninguém iria mexer. Não havia os famosos e chatos sobrinhos do capitão, pedindo para olhar e tomar conta do carro. Ubatubano não era dado a isso. Quando saíamos para as festinhas ou boates todos tomavam conta de todos. Havia brigas, claro, ninguém era santo. Mas, posso dizer, dificilmente acabava na delegacia. Se você saísse muito fora da linha os primeiros a saber eram seus pais. E poucos tinham telefone e Internet nem existia! Bastava você aparecer em algum lugar que não seria comum você estar e logo aparecia alguém perguntado: "o menino, o que você(s) está(o) fazendo aqui? Seus pais sabem que vocês estão aqui?" Aquilo era um sinal de que deveríamos procurar outro lugar. Logo os nossos pais saberiam onde estivéramos. Era melhor não dar bandeira. Jabuticaba, carambola, caju havia em vários quintais ou em terrenos ermos. Era pedir ou subir e pegar. Ingá? No rio Grande ao lado da escola Dr Esteves da Silva. Goiaba? Do campo de aviação e pela Estufa adentro saindo depois no Itaguá qualquer moleque colheria e comeria a goiaba que quisesse. Cana? Well, no quintal de casa. Se quisesse se aventurar um pouco iria até a Fazenda Velha (Irmãos Chieus e Cia.) e, com sorte, poderia sorver do mel da cana. Ela em seu melhor estado. A boa e inesquecível Ubatubana. A praia descortinava o mundo às aventuras pueris, juvenis, soturnas e noturnas. Dávamos mergulhos de corpo a la Os Cafajestes e alma como quem mira o oceano e tem muito a pensar. Ubatuba é para o ubatubano o mar em seu estado sem tempo, perene. O mar era e é extensão de nossa casa, corpo e alma. Hoje cabe a pergunta: pois é, pra quê? Jabuticabas, carambolas, cajus, goiabas, cana da boa, parece que não há mais. Os mesmos interesses que deveriam formar uma comunidade transformaram-se em interesses mesquinhos que foram elevados e tidos como interesses maiores. O viver e ser feliz a qualquer preço tornou-se moda constante num aviltamento do ser e no dimensionamento do ter. A cultura, no sentido sociológico, morreu na praia. Justiça poética? Os que vieram para cá e se aboletaram já chegaram de costas para os ubatubanos ao criarem seus nichos de interesse diversos daqueles da cidade que os acolhia. E ficaram e estão de costas para o mar. O mar nada lhes diz. É um monte de água onde não se pode ocupar e fincar pé. Não é e não foi por livre escolha nossa. Talvez, nem deles. Mas, aí já é outra história. Há solução? Se alguém souber de um final feliz avise-me. Ou cartas, e-mails para a redação.
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