A galerinha que tem duas mãos esquerdas, ou que defende propostas e ideias canhotas sem o saber, tem uma maneira de raciocinar delirante que, se não fosse danosa, seria digna duma comédia pastelão. Lembram das discussões sobre a dita lei da palmada? Pois bem, naqueles idos, para as pessoas boazinhas que eram a favor da dita cuja qualquer um que se posicionasse contra a sua aprovação era tido como sendo uma pessoa favorável ao espancamento de crianças. Ora, quando uma pessoa dá uma volta dessa para se empavonar, ao mesmo tempo em que transforma seus antagonistas em criaturas disformes, das duas uma: ou ela é muito tonta, ou é mau caráter do princípio ao fim. E o que é mais interessante nesses disformes tipos humanos é que eles tratam os infantes como se eles fossem pecinhas de porcelana extremamente frágeis que podem ser danificadas a qualquer momento com um olhar feio ou uma bronca ríspida. Os tontos não percebem que se agirmos desse modo estaremos criando uma geração de mimados que acredita que tudo deve existir para servi-los e paparicá-los. Mas a vida não é para molengas não meu filho. Vovó sempre me dizia e os fatos nunca contradisseram essa verdade elementar da existência. E é claro que eu não preciso nem dizer que uma pessoa que cresce sendo mimada e protegida ao extremo pela família, pelas instituições e pelo Estado terá o seu ego deformado e inflado e não será um ser humano melhor, muito menos um cidadão ideal. Na real, ele será transformado simplesmente num monstro, num poço de insatisfação que facilmente será manipulado por todo aquele que lhe disser que seu descontentamento deve ser encarado como um direito fundamental não atendido. Leis com a mesma tônica da “lei da palmada”, e mesmo o próprio ECA, são inegáveis instrumentos de engenharia comportamental em larga escala. Todo aquele que trabalha com educação, e não é uma pessoa “boazinha”, sabe muito bem do que estou falando. Da mesma forma que todo indivíduo que tenha deitado as vistas no livro “O Maquiavel Pedagogo” de Pascal Bernardin, compreende muitíssimo bem a gravidade do quadro atualmente vivido em nosso país que vem há décadas deformando gerações e gerações de indivíduos que, em muitos casos, hoje exercem poder sobre a sociedade. Se não nos enquadramos em nenhuma das hipóteses, conjeture a seguinte situação: você está em uma sala de aula e, um aluno, digo, sete alunos, pintam e bordam na classe. Debocham de você, implicam com todos e com tudo. Os pais dizem que não podem com a vida deles e a escola esgotou todas as possibilidades ventiladas pela sua limitada autoridade. O que se deve fazer? Chamar o Conselho Tutelar? A patrulha escolar? O Chapolim Colorado? Pois é, tamanha é a morosidade burocrática criada que qualquer possibilidade educativa de uma ação punitiva vê-se transmutada em seu contrário. O recado dado por essa lentidão, pela delegação do exercício da autoridade de um para outro, dá um claro recado para o infante desajustado que tudo isso não passa de um faz de conta que, no fundo, não dá nada (e não dá mesmo) e que quem manda no pedaço é ele mesmo. Esse tipo de perversão torna-se cada vez mais cotidiana em nossa sociedade; em nosso sistema de ensino. Só não vê quem não quer; quem não quer reconhecer as indefectíveis marcas de suas ideologias nas práticas [des]educativas implantadas em nosso país e nas leis iníquas que foram inspiradas nelas e que estimulam a vandalização da ordem dos valores e, consequentemente, de toda a sociedade. Mas, fazer o que? Os iluminados são eles que estão tentando mudar a natureza humana para edificar uma sociedade perfeita. E sonham isso se esquecendo das máculas e vícios que habitam os seus corações que deformam, direta e indiretamente, a sociedade. Na verdade, todo esse papo utópico de gente muito metida à boazinha e sabidinha é apenas uma declaração inconfessa de que eles querem apenas, por um complexo narcísico, transformar a sociedade e a natureza humana em algo tão disforme quanto eles mesmos para, desse modo, não sentirem-se mais tão solitários em seus devaneios totalitários. Intenção essa que, a cada dia que passa, torna-se cada vez mais evidente.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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