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Opinião
11/05/2005 - 14h28
Filho de gay, gayzinho é?
Elizabeth Zambrano - Pauta Social
 

As "certezas" do senso-comum, como a que está sendo acionada pelo dito popular parafraseado no título, muitas vezes não encontram o respaldo necessário nos resultados de pesquisas empíricas. Esse é o caso da adoção por homossexuais. Em que pese a legitimidade das preocupações com o bem-estar da criança, os mitos sociais - em sua maioria negativos - sobre as conseqüências desse tipo de parentalidade até hoje não obtiveram nenhuma comprovação segundo as pesquisas que vêm sendo realizadas desde os anos 80 em países como Estados Unidos, Canadá, Bélgica e, ultimamente, França.

Embora defendidas por algumas correntes teóricas, idéias tais como a necessidade de pais heterossexuais para a criança ter noção da diferença dos sexos, dificuldades na identidade sexual por falta de um modelo do mesmo sexo que o seu, déficits e problemas no desenvolvimento psíquico, maior probabilidade de doença mental como depressão, maior "risco" de ser também homossexual, grande sofrimento devido ao preconceito, estão sendo desconstruídas pelos dados empíricos. As pesquisas apontam ser a qualidade das interações entre as crianças e seus pais/mães o fator mais importante para o seu bom desenvolvimento social e psíquico, pois o modelo de identidade, tanto para um sexo quanto para o outro, está dado pela presença de outros adultos significativos (avós, professores, amigos dos pais/mães) e pela própria cultura.

As possibilidades de essas crianças serem homossexuais ou sofrerem de alguma doença mental são as mesmas do restante da população. Apontam, também, que elas aprendem quando e como combater a discriminação, da mesma forma que as crianças de outros grupos minorizados, escolhendo os amigos com quem vão poder compartilhar a informação. É previsto que problemas no relacionamento com os pais aumentem na adolescência, quando o homoerotismo poderá servir de "cavalo de batalha" para as necessidades de separação, autonomia e diferenciação, normais nessa fase do desenvolvimento, da mesma maneira que outras características parentais são acionadas pelos adolescentes em outros tipos de família.

O conjunto dos trabalhos realizados naqueles países ao longo dos últimos vinte anos apresenta um resultado tão contundente que estimulou a manifestação de várias entidades de classe nos EUA em favor da liberação para casamento e adoção por homossexuais, como a Associação Americana de Psicanálise, Associação Americana de Pediatria, Associação Americana de Antropologia, entre outras de igual peso. No Brasil, foram divulgadas algumas opiniões particulares de psicanalistas, antropólogos, médicos, juízes, desembargadores e outros, cujo conteúdo nem sempre é concordante.

Também no Brasil está em andamento, desde setembro de 2004, o projeto de pesquisa do Instituto de Acesso à Justiça (IAJ), chamado "Direito à Homoparentalidade", apoiado pelo Programa de Apoio a Projetos em Sexualidade e Saúde Reprodutiva (Prosare) e Fundação McArthur. Os dados preliminares coletados em Porto Alegre vêm confirmando os resultados dessas novas pesquisas realizadas em vários lugares do mundo.

Tendo em vista essa contradição entre o processo que tem, por um lado, redescobertas sobre as formas de pensar e agir com relação à homoparentalidade e, por outro, a manutenção de mitos e formas tradicionais de se posicionar em relação ao tema, evidencia-se a urgência de uma maior reflexão não só sobre as causas que impedem a ampla divulgação desses resultados, mas também sobre o porquê de se insistir sobre a sexualidade dos pais quando se trata da adoção. Será que a sexualidade deveria distinguir uma categoria de pais? A capacidade de ser pai ou mãe tem a ver com gênero e sexualidade? Famílias homoparentais têm mais a ver com homossexualidade do que com parentalidade? Por que deveríamos distinguir pais/mães homossexuais dos outros pais/mães?

É necessário lembrar a decisão do Juiz da 2ª Vara de Família de Porto Alegre, Roberto Lorea que afirma, em sentença relacionada ao "casamento gay", brilhante pela simplicidade e clareza que, segundo a Constituição de 1988, nenhum cidadão brasileiro poderá sofrer discriminação de qualquer tipo. Não há, assim, necessidade de especificar o tipo de casamento pois só existe um. Não seria, portanto, hora de começarmos a exigir que essas pessoas fossem respeitadas no seu "desejo de filhos" e tivessem acesso à adoção sem serem "questionados" quanto às suas práticas sexuais, da mesma forma como não são "questionados" todos os outros cidadãos brasileiros?


Nota do Editor: Elizabeth Zambrano é médica psicanalista e antropóloga, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Antropologia do Corpo e da Saúde da UFRGS, coordenadora do projeto "Direito à Homoparentalidade", do Instituto de Acesso à Justiça.

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