A escolha do tema para a redação no exame foi mais do que oportuna. Os jovens precisam se conscientizar da existência da violência contra a mulher e, a partir daí, começar a discutir! A violência contra a mulher é mais do que uma triste realidade presente no dia a dia. É uma cultura que, se fosse ouvida, enxergada e falada, não precisaria cair numa prova, apesar do Brasil ocupar o sétimo lugar no ranking mundial de violência doméstica contra a mulher. A escolha do Enem trouxe uma grande chance para a sociedade ter que falar sobre isso. Muitos aplaudiram. Muitos ficaram irados. Muitos se aproveitaram. Inclusive, vi políticos desviando o assunto para outras minorias que merecem o mesmo respeito, mas que não são a bola da vez. Esta cultura, infelizmente, perdura há milhares de anos e, se queremos de fato mudá-la – e queremos! –, somente com ações grandiosas como essa é que conseguiremos tirar o assunto debaixo do tapete. A violência contra a mulher é uma chaga em nossa sociedade que precisa ser tratada com o máximo de atenção e cuidados. Há cura para este mal, apesar das muitas cicatrizes que ainda deixa. Ao levar a questão da violência contra a mulher para o ENEM, conseguiu-se o que há tempos se busca, porém com ações homeopáticas e de alcance infinitamente menor. Abriu-se o debate com quase oito milhões de jovens brasileiros, de diferentes partes e cultura do nosso País. Como não aplaudir esta oportunidade? Se conseguirmos falar sobre isso abertamente para conscientizar os jovens, homens e mulheres, de que não existem razões que justifiquem diferenças entre os gêneros, que os direitos e deveres são iguais, será possível então pensar num futuro melhor mais rápido. Que sonho! Algumas pessoas acham, equivocadamente, que a violência contra a mulher se resume à abominável agressão física - socos e pontapés - que, não raro, ela recebe de seu companheiro, na sua própria casa e, muitas vezes, diante dos olhares assustados de seus filhos. Não! A violência contra a mulher vai além: na rua, no trabalho, no transporte, na escola e até mesmo nos hospitais. É física, moral e psicológica. E se manifesta de diferentes formas. Exemplos? A mulher recebe salário inferior aos dos homens quando desempenha a mesma função; é insultada na rua com “brincadeiras” machistas e sexistas; e, no transporte coletivo, sofre assédio sexual. As mulheres negras, nas maternidades, recebem menos anestesia. Foi em 1932 que a mulher passou a ter direito a voto. Foi em 1962 que passou a não precisar de autorização do marido para trabalhar (estatuto da mulher casada). Foi em 1988 que a Constituição Federal apregoou a igualdade. Foi em 1995 que obrigaram a cota de 30% de mulheres para as disputas eleitorais partidárias. Foi em 2006 que a Lei Maria da Penha foi aprovada. E em 2015, enfim, foi aprovada a lei contra o Feminicídio. Sabemos que não é com uma Lei que se muda comportamento humano, principalmente se não há a estrutura necessária, típico caso da Lei Maria da Penha. Acho que a redação do ENEM, num mundo de caos (em seu verdadeiro sentido), pode ser a resposta que o Congresso estava a merecer desde a semana passada, quando foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) a supressão ao direito de aborto em caso de estupros. Um dos maiores retrocessos de nossa História na questão da mulher, que poucas pessoas estavam sabendo, tem como resposta a exposição do tema para muito mais do que oito milhões de jovens, que também falaram a respeito dele junto às suas famílias. O tema da violência contra a mulher, enfim, nunca mais vai sair de pauta. E é por isso que o Brasil acaba sendo maravilhoso. Ele se combate. Graças a Deus! Nota do Editor: Rosana Chiavassa é advogada e presidente da ASAS - Associação das Advogadas, Acadêmicas e Estagiárias do Direito de São Paulo.
|