A que ponto chegou o desvario relativista que se espalha feito praga nessas paragens tupiniquins. É, caro leitor, estou falando daquela "filosofia" rasteira que, entre outras aberrações, defende que "a virtude está sempre no meio" e que "o absoluto não existe". Alguns exemplos: durante a recém encerrada "Cúpula dos insensatos", o Ministro Celso Amorim, exibindo o seu indefectível oportunismo diplomático (tendência a sacrificar os princípios para transigir com as circunstâncias e acomodar-se a elas), ressuscitou aquela antiga cantilena esquerdo-relativista (cuja real intenção é menos agradar aos árabes do que fustigar americanos e israelenses) de que "o terrorismo é condenável, mas existem exceções". Como se matar inocentes desprevenidos e a sangue frio fosse justificável quaisquer que sejam os interesses encobertos. Na mesma oportunidade, o "Demóstenes de Garanhuns" (apud Mário Guerreiro) defendeu a não inclusão do termo "democracia" na versão final da carta de Brasília alegando que "não seria democrático impor o meu (dele) conceito de democracia ao mundo árabe". Dessa estultice pode-se concluir, dentre outras coisas, que o senhor absoluto de todos os oráculos desfruta de um conceito de democracia só dele. Só espero que um dia ele não resolva nos mostrar, empiricamente, esse conceito. Acerca desse fato, peço licença para transcrever a carta de um leitor do jornal O Globo, publicada em 13/05, cuja crítica, além de pertinente, é bastante espirituosa: "Na TV o presidente justificou a falta de referência à democracia na Carta de Brasília dizendo que não seria democrático impor o nosso conceito de democracia ao conceito de democracia vigente no mundo árabe. Então me dei conta de que no mundo só existem democracias. A democracia cubana, a democracia saudita, a democracia da Coréia comunista, a democracia chinesa, a democracia vigente na antiga União Soviética, e assim por diante. Por analogia, não acho honesto impor o conceito de honestidade do senador Pedro Simon, por exemplo, ao conceito de honestidade dos fiscais do propinoduto, ao conceito de honestidade do juiz Nicolau ou de tantos outros, nesse caso, injustamente chamados de corruptos. Afinal, apenas adotavam um conceito pessoal de honestidade. Portanto, que se corrija a injusta cassação do deputado André Luiz, punido que foi apenas por professar um personalíssimo conceito de honestidade." (JAYME LOURENÇO GUEDES FILHO) Na mesma edição daquele diário, o articulista Merval Pereira critica as palavras presidenciais nos seguintes termos: "Ao aceitar que a defesa da democracia não constasse da declaração final da Cúpula América do Sul-Países Árabes, o Brasil, mais uma vez, em nome do pragmatismo comercial, abriu mão de valores que não deveriam estar sujeitos a esse tipo de pressão. Além do mais, teria sido dispensável a tentativa de explicação do presidente Lula sobre a variação dos valores democráticos, como se existisse "meia democracia". Ainda mais que ele já tem no currículo a sistemática complacência com Fidel Castro, seu ditador preferido, e uma compreensão infinita do que seja a "revolução bolivariana" de um outro amigo polêmico, Hugo Chávez. O palavrório relativista pode ser rebuscado ou, como dizia Karl Popper sobre a verborragia hegeliana, altissonante, mas a mensagem é simples: num mundo onde nada é absoluto e, portanto, não há princípios ou limites, tudo é permitido. Retidão, ética e justiça são conceitos tão vagos (para eles) que não deveríamos condenar ninguém. Um estuprador, tal qual um terrorista, na visão dessa gente, terá, decerto, motivos ocultos e suficientes para praticar os seus atos. Não o acusemos, portanto. A propósito, por que não acabar com a instituição judiciária, afinal quem tem o direito de julgar alguém? Nota do Editor: João Luiz Mauad é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
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