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SEÇÃO
Crônicas
29/12/2015 - 10h13
Esta coluna não está em greve
Henrique Fendrich
 

Foi quando a crise atingiu a mim, eu digo, atingiu MESMO a mim, no meu ponto fraco, nevrálgico, e eu logo acusei o golpe, fiquei atônito, aturdido, sem saber o que fazer da minha vida dali para frente. Havia passado pelo aumento das passagens de ônibus com relativa tranquilidade, e este foi o meu mal, pois achei que nada de pior podia me acontecer. Mas eis que de repente eu me deparo com a porta da biblioteca fechada, escandalosamente fechada, e isso bem no dia em que eu precisava emprestar algum livro, porque já havia lido tudo o que havia para se ler na minha casa. E me veio então uma terrível imagem: eu, naquela noite, tendo que dormir sem nada para ler. Ah, meus amigos, nunca a minha consciência política bateu tão forte e, houvesse dois ou três ali comigo, eu teria começado alguma revolução. Fiquei, no entanto, desorientado, diante do cartaz que anunciava a paralisação.

A biblioteca estava fechada, e ainda está, porque os servidores estão em greve. Os servidores estão em greve porque ainda não receberam o dinheiro que cabe a eles. O dinheiro que cabe a eles ainda não foi pago porque o governo não tem dinheiro para pagar. O governo não tem dinheiro para pagar porque... ora, o diabo sabe por que é que o governo não tem dinheiro para pagar. Tudo o que sei é que, em consequência disso, a porta da biblioteca está fechada, o que me impede de emprestar livros e adquirir conhecimento para que, quem sabe, um dia não haja mais tantos motivos para tudo entrar em greve.

E, se for ver, é tudo mesmo, é difícil o dia em que não haja pelo menos uma grevezinha atravancando a vida por aí. Se não são os servidores são os bancários, são os professores, são os carteiros, são os motoristas de ônibus, são os caminhoneiros... Sempre que muitas greves começam a pipocar ao mesmo tempo eu lembro de um livro do Anthony Burgess chamado “1985”. Sim, tem um livro chamado “1985” e, sim, ele tem relação com o “1984” do Orwell. E digo mais, o “1985” está muito mais próximo de acontecer do que o “1984”. Porque ele fala justamente sobre um aumento sem precedentes no número de greves. A coisa chega ao ponto de os bombeiros entrarem em greve e por isso não atenderem o chamado para apagar o incêndio de um hospital. O prédio é todo destruído e morre todo mundo que estava lá. E assim muitas outras greves acontecendo ao mesmo tempo, em todos os setores, e que acabam fazendo do governo um mero fantoche.

Sei lá, não me parece que estamos longe disso. E não se pense com isso que essa grevaiada toda não possa ser justa – normalmente é. Mas é preocupante, sem dúvida é preocupante quando um cidadão de bem não consegue arrumar um livro para ler antes de dormir. E como não parece que essa crise vai passar tão cedo, gostaria de tranquilizar os meus quatro ou cinco leitores e garantir que não pretendo privá-los dessa coluna, por mais justas que sejam as reivindicações e por mais necessária que pareça uma paralisação do setor. Resistirei ainda que o Sindicato dos Cronistas me ameace com a desfiliação. Não decorre daí que eu não tenha espírito de classe, mas unicamente que não consigo ficar muito tempo sem escrever.

Dito isso, consolemo-nos mutuamente e sigamos em frente.

 

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