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Opinião
23/05/2005 - 18h05
Sarney, o bengalinha
Ipojuca Pontes - MSM
 

Caiu-me em mãos (como diria Machado), inadvertidamente, um artigo de Zé Sarney, político falso até no nome (pelo que se diz, foi batizado e atendia no Maranhão pelo nome de José Ribamar). O escrito assinado por Sarney carrega o título apelativo de "Cúpula e Orgasmo", e se pretende "uma leitura positiva sobre a Cúpula América do Sul-Países Árabes", ocorrida em Brasília por obra da bisonha diplomacia do governo Lula, largamente sustentada pelo bolso já saturado do saqueado contribuinte. Zé Ribamar, digo, Sarney quer passar por articulista moderninho e intromete, como "gancho", no final do exercício sofístico, uma alusão ao Dia do Orgasmo criado na mesma data por prefeito de uma cidade do Piauí. Talvez Sarney tenha partido do pressuposto de que enfiando a palavra "orgasmo" na cabeça do texto, pudesse atrair leitores para o seu puxa-saquismo disfarçado de "opinião". Se bem entendi, na visão do "vassalo" da Constituição Cidadã, nem mesmo o evento orgástico (e oportunista) bolado pelo prefeito piauiense empanou o "desfile dos árabes".

Na ânsia de mostrar serviço ao poder vigente, o Estadista do Brejal considera, de início, que a imprensa, no tocante à cobertura do evento, incorporou a impressão de "que o acessório é o principal", o que, para ele, Sarney, "é uma forma de desinformar, pois as versões conflitam com os fatos". Sarney, digo, Ribamar parte da "visão crítica" de que a mídia esqueceu o aspecto essencial, a dimensão da "janela política e comercial" da Cúpula, para enfatizar, indevidamente, detalhes como, 1) a quizumba Brasil-Argentina 2) a verborragia do coronel Chávez, 3) a etimologia e a definição das palavras "terrorismo" e "democracia" e, 4) a saída à francesa de Kirchner. No seu (dele, lá) arrazoado falacioso, assumindo a condição (no fundo, burlesca) de pitonisa do improvável, assevera que o "Brasil assumiu com êxito o seu lugar de parceiro global", realçando a "capacidade de organização" da diplomacia brasileira por conseguir "num espaço de tempo muito pequeno, mobilizar todos os países daquela região e obter a participação e o engajamento para que o evento tenha continuidade". Por fim, arrematando o tradicional bom-mocismo embigodado, Zé Sarney destaca, ar senhorial de Casa Grande & Senzala, que "o chanceler Celso Amorim foi de grande competência".

Vamos por partes, como diria a velha cozinheira ao destrinchar o leitão. Em primeiro lugar, a imprensa, ou pelo menos a maior parte do noticiário, não esqueceu em absoluto os aspectos políticos e comerciais da ASPA. De fato, eles tomaram o espaço das principais manchetes dos jornais. Apenas e tão somente a generalidade dos observadores, amparada nos fatos e acontecimentos, considerou a Cúpula um retumbante fracasso (salvo alguns articulistas de órgãos abastecidos pela generosa pauta de Gushiken). E assumiu tal postura pelas mais diversas razões, entre elas: o descaso de países do mundo árabe alinhados com os EUA, e a ausência deliberada de importantes líderes regionais, entre eles, Hosni Mubarak e o espalhafatoso Muammar Kadafi, o antigo cultor do terrorismo por atacado. No plano político, dentro da cúpula, como foi anotado, o Brasil apenas comprometeu-se oficialmente com governos instáveis internamente (os casos notórios da Argélia, Síria, Líbano e Arábia saudita), sem que nada de concreto nos fosse dado de antemão, a não ser o repúdio consignado aos israelenses e norte-americanos. No incensado plano econômico, por sua vez, as nossas conquistas reais - é forçoso reconhecê-lo - estão ainda indexadas ao cadastro do fenômeno óptico reconhecido no deserto do médio oriente como "fata morgana" - a miragem sempre tremulante, distante, vaga e pouco tangível.

Não vivesse Zé Sarney sempre bordejando o "pudê", ou se arrastando para mantê-lo, na certa veria as coisas de um modo concernente com o real. O diabo é que o Estadista do Brejal, por razões que nem Freud explica, enxerga tudo sob o ângulo do político menor e provinciano, o que reduz a visão da realidade ao nível do mesquinho interesse pessoal. Só assim se justifica o fato de um ex-presidente da República ignorar que o conflito entre palestinos e israelenses não se define mais como o problema principal do mundo árabe, deslocando-se hoje o eixo da questão para a confrontação dos governos locais ameaçados internamente pela sublevação dos movimentos que se insurgem contra o poder teocrático.

O desconhecimento de verdade tão elementar para qualquer observador faz Sarney conferir loas ao "Itamaraty vermelho" de Lula, que, sôfrego para sentar numa cadeira permanente do Conselho de Segurança da ONU, nulifica qualquer resquício de lucidez e parte para jogar lenha na fogueira do solucionável conflito entre israelenses e palestinos - o objetivo implícito da tal cúpula América do Sul-Países Árabes. De fato, na ordem prática das coisas, a política externa do governo Lula tocada por Zé Dirceu, Marco Aurélio Garcia, Samuca Guimarães e, em escala decrescente, Celso Amorim, o apontador de viagens, significa um lamentável retrocesso da diplomacia brasileira, derrotada na maioria das articulações que se dispõe a efetuar, como evidenciam os casos da eleição de Pascal Lamy para a OMC, das retaliações da Argentina no Mercosul, do deboche premeditado de Kirchner na Cúpula, do fracasso das negociações com a União Européia e da confrontação ideológica com os EUA na criação da ALCA. Nem Silveirinha, o empedernido chanceler da ditadura Geisel, errou tanto.

Sarney é o "bengalinha" dos políticos. Vive escorado em leis permissivas e projetos corporativos, mas criadoras de privilégios, todas amplamente questionáveis e nocivas aos cofres da nação e ao bolso do sofrido contribuinte. Como o Brasil é um país de trouxas, o Estadista do Brejal vai distribuindo suas bengaladas por aí, na firme crença de que, num espaço onde não se associa causa e efeito, pode-se, sim, enganar a todos, a qualquer tempo e hora.

PS - O orgasmo do escrito de Sarney fica mais adequado na notícia de jornal de Brasília que conta da contratação de 50 prostitutas (sem véus, a US$ 400 por cabeça) para saciar o apetite sexual (recalcado) dos árabes durante a ASPA - o que pelo menos demonstra que eles não são tão ortodoxos nos seus fundamentalismos.


Nota do Editor: Ipojuca Pontes é cineasta, jornalista, escritor e ex-Secretário Nacional da Cultura.

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