Num dos momentos mais críticos da administração pública nacional, onde o governo federal descumpre seus compromissos, os estaduais restringem repasses aos municípios e as prefeituras deixam de prestar serviços fundamentais à população ou – pior ainda – negligenciam na sua prestação, por não terem dinheiro, ressurge a questão dos supersalários. Levantamentos do Ministério da Fazenda e do Congresso Nacional revelam que mediante o simples cumprimento da norma constitucional que limita os salários do funcionalismo a R$ 33.7 mil mensais (o mesmo que ganha o presidente do Supremo Tribunal Federal), o país economizaria R$ 10 bilhões por ano, o equivalente ao que o governo pretende arrecadar anualmente com a criação da nova CPMF. Revela-se que, apesar do limite constitucional, existem procuradores do Ministério Público Federal recebendo R$ 62 mil mensais, funcionários aposentados do Superior Tribunal de Justiça com R$ 100 mil por mês, servidores do legislativo com supersalários e o mesmo ocorre em outras esferas do governo, também nos estados e municípios. Procuradores públicos – ativos e aposentados – além dos seus salários e gratificações, ainda têm o direito de receber por sucumbência dos processos em que atuaram como representantes do poder público. Médicos e outros profissionais acumulam rendas diversas e, nem por isso, prestam maiores serviços que os demais. É a república dos privilégios, constituídos pelo bom tráfego ou até pela pressão dos profissionais junto aos governantes de diferentes épocas, e pelo aproveitamento sagaz de brechas legais. E eles ficam irritados quando, por alguma razão, têm revelados os astronômicos ganhos vindos do cofre público. No ano passado, o governo enviou ao Congresso um projeto que pretendia eliminar os supersalários. Contudo, na tramitação pelas comissões, a proposta já foi descaracterizada e, se for aprovada, os privilégios continuarão. Poucos continuarão vivendo na riqueza enquanto o povo permanecerá cada dia mais miserável e desassistido. A Constituição, como lei maior, deveria ser rigorosamente respeitada. Não há razão para alguém – não interessa quem e onde esteja – ganhar dos cofres públicos entre três e quatro salários mínimos por dia, enquanto boa parte da população ganha apenas um por mês e, muitas vezes, menos que isso. É certo que todos os titulares de supersalários têm uma boa justificativa legal para o valor elevado. Mas ela não pode prevalecer, em nome da democracia, da economia e, até da moral. Afinal, também é constitucional o princípio de que todos são iguais perante a lei. Cadê a igualdade? Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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