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Crônicas
27/05/2005 - 16h20
As velhinhas da Câmara
Chico Guil - Agência Carta Maior
 

Quem me contou foi um palestrante, se não me engano, da cidade de Madri, no Centro-Oeste paranaense. A história é tão inverossímil quanto dizer que Condoleeza Rice esteve no Brasil para fomentar a união entre os povos americanos. Mas acreditei no que ouvi, mais por necessidade de acreditar que algo bom ainda pode acontecer do que propriamente pela possibilidade real de que tenha acontecido. Estavam lá, quatro senhoras aposentadas, mentalmente ativas, em busca de alguma emoção diferente da sempre tediosa novela das oito. Cinema, literatura, teatro e outras encenações artísticas já não lhes bastavam. Queriam ver de perto como funciona o poder, aquele que emana do povo, que faz uma fumaceira danada no centro da cidade e depois se concentra todo no caldeirão das vaidades municipais. Acomodaram-se as senhoras nas cadeiras dos fundos, como convém aos visitantes de primeira viagem. Anotaram tudo que ouviram naquela noite. Desconfiadas com o comportamento pouco produtivo e demasiado demagógico dos vereadores, gastaram o resto da semana escarafunchando a Lei Orgânica do Município. Na sessão seguinte trouxeram mais duas amigas e tomaram assento mais à frente, ali pela quinta ou sexta fila. Como a plenária estava quase vazia, os edis não puderam deixar de notar aquele inusitado conjunto de expectadoras.

Na terceira sessão, o grupo das aposentadas triplicou. E um dos legisladores aproveitou seus dez minutos - que podem se transformar em 15 ou 20, caso o nobre seja amigo do presidente da Casa - à frente da tribuna para elogiar a atitude daquelas "pessoas idosas, que devem servir de exemplo para a nossa juventude". Como sempre ocorre nesses casos, os outros, enciumados, tomaram para sim essa brilhante idéia e utilizaram todo o tempo disponível em tribuna para lapidar a jóia, transformando a presença das aposentadas num grande acontecimento. Alguns mais letrados, para dar estofo ao seu generoso discurso laudatório, arrancaram do fundo do baú frases de Machado de Assis e Aristóteles, enquanto os menos favorecidos pela cultura utilizaram citações de Zeca Pagodinho e Amado Batista, demonstrando o quanto estavam honrados com tão benévola presença!

Nessa altura, as merecedoras de tamanhos aplausos sentiram-se no direito de solicitar um espaço na tribuna da Câmara, e foi o que fizeram no transcorrer da semana. Mais que depressa os vereadores consentiram, na esperança de colher em dobro os elogios que semearam.

Na sessão seguinte o grupo triplicou, formando um bolinho de gente nas primeiras cadeiras. O presidente apresentou as honras da Casa, solicitando, imediatamente após a costumeira leitura da Bíblia, que aquele grupo de civilizadas "e ainda jovens senhoras" tomasse seu espaço junto à tribuna.

A bomba explodiu já nas primeiras palavras, quando os edis ouviram a representante das aposentadas dizer a verdade, aquelas coisas que todo cidadão consciente diria, se tivesse coragem, após assistir a algumas sessões de uma câmara de vereadores. Os representantes do povo não sabiam onde se esconder. Empalideceram, depois avermelharam, ficaram roxos, azuis, e finalmente tomaram aquele tom esverdeado que caracteriza o desejo de vingança. Fomos apunhalados! Era só nisso que pensavam. Em nenhum momento cogitaram a possibilidade de avaliar aquelas sábias palavras, pronunciadas por uma sábia senhora, numa sábia análise da condição do homem público.

O movimento daquelas mulheres tomou volume, ganhou publicidade, amealhou uma multidão em um movimento pela ética na política da cidade, que acabou se refletindo brutalmente sobre o paço municipal, resultando na queda do prefeito, considerado um dos maiores populistas da região. Sabe aquele tipo que aparece do nada com um discurso estilo "caçador de marajás" ou "prefeito dos pobres" e de repente está com duas ou três mansões e várias empresas de sucesso? Era o cara. O movimento das aposentadas fez ruir a moral do Legislativo e, com ela, o ditador executivo, que ditava as regras àquela Casa de Leis.

Não sei se isso realmente aconteceu. Perguntem ao palestrante. Seria bom que acontecesse.

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