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Crônicas
30/05/2005 - 12h41
Quero ser Tom Sawyer
Antônio Azevedo - Agência Carta Maior
 

A páginas tantas do romance As aventuras de Tom Sawyer, de Mark Twain, exclama o herói do livro: "Se é bom ou se não é, eu não sei. Tudo o que sei é que é do gosto de Tom Sawyer."

Tom Sawyer era um garoto rebelde, que tinha em Huckleberry Finn, filho de um vagabundo alcoólatra e o único garoto da cidade que não freqüentava a escola, seu melhor amigo. Huck, como era conhecido, desencaminhava Tom Sawyer, que participava de aventuras com ele e matava aula para seguir seu amigo. Era do gosto de Tom Sawyer compartilhar das aventuras rocambolescas de Huck. Em outras palavras, tia Polly, que criava Tom, tinha dificuldade em controlar o garoto. Ela até pensava, "Poupa a vara, estraga a criança", tentando tomar as rédeas da carruagem. Tempo perdido, nada adiantava com Tom Sawyer, que tinha espírito de liberdade e personalidade própria. Já a telespectadora de um certo programa de televisão é o oposto de Tom Sawyer, pois ligou para a emissora perguntando se calça jeans com salto alto estava na moda. Pode-se depreender que, se estivesse na moda, ela sairia à rua com calça jeans e salto alto; caso contrário, não saía.

A pergunta que eu faço é a seguinte. Qual é mais fácil de controlar, Tom Sawyer ou a telespectadora?

Tom Sawyer era incontrolável, não se submetia às estruturas de dominação. Tia Polly que o diga.

É do gosto das telespectadoras serem controladas.

Faço outra pergunta. Que espécie de controle poderia ser exercido sobre seis bilhões e quatrocentos milhões de Tom Sawyers? Se tia Polly, que era enérgica e sábia, não conseguia controlar um Tom Sawyer, quem assumiria o mando de uma carruagem mundial que comungasse nos ideais de liberdade de Huck Finn?

Ninguém manipularia esta carruagem.

Pode-se supor que o mundo seria um caos. Mas caos ele é. E o mundo de Tom e Huck era também um caos, que dava, no entanto, muito prazer a quem nele vivia, crianças do mundo todo e também adultos, recordando a própria infância, deliciaram-se com as aventuras de Tom e de Huck. E o mundo de telespectadoras ignorantes, que não sabem sequer se está ou não na moda calça jeans com salto alto, é um outro tipo de caos, que nada tem do romantismo do mundo de Tom e de Huck Finn. É de se perguntar o que essas telespectadoras sabem. E nem os adultos do futuro (ou de qualquer tempo) vão deliciar-se com as desventuras dos seis bilhões e quatrocentos milhões de telespectadores ignorantes que habitam o mundo. Muito pelo contrário. Vão horrorizar-se. Eu considero-me um Tom Sawyer em busca do meu "Huckleberry friend", como na música. Podem ver-me como um coqueiro solitário no meio do deserto sendo açoitado pelos fortes ventos de até 500 quilômetros por hora enquanto todos os outros coqueiros para se proteger das ventanias refugiaram-se em estádios de futebol, em igrejas, em poltronas diante da televisão. É sabido que o coqueiro enverga, mas não quebra, e tampouco é arrancado do chão, pois já se encontraram raízes de coqueiros, extremamente ramificadas, a até 16 metros de profundidade. Enquanto não vem um vendaval mais forte que me derrube vou continuar a pregar no deserto. Sinto-me bem aqui.

Já dizia Nelson Rodrigues que toda unanimidade é burra. Se Nelson Rodrigues estava certo, nós assistimos a um festival de burrice pela televisão. Generais do Pentágono, ONGs, ONU, a CIA, o papa, jornais do mundo todo (menos o tablóide que publicou as fotos), âncoras de telejornal, os inevitáveis telespectadores, todos foram unânimes em condenar a "humilhação" a que se submeteu o ditador Saddam Hussein ao publicar fotos dele de cueca.

O sujeito é culpado de genocídio e não se pode publicar fotos dele de cueca. Ele pode torturar e matar prisioneiros; mas nós não podemos sequer publicar fotos dele de cueca, profanando sua sacrossanta privacidade. Nem que seja para desmascarar o fanatismo islâmico. A privacidade e o direito à vida das vítimas dele vão para as cucuias. Só falta proibir falar mal de Hitler, em respeito à memória dele.

E o casamento na cadeia de um traficante, culpado de mais de 60 homicídios, dentre eles, o do jornalista Tim Lopes, que foi barbaramente torturado antes de ser executado. E as autoridades brasileiras prestam-se a essa palhaçada - conste que os policiais não têm culpa e são obrigados a fazer papel de palhaços pela legislação brasileira. Com dinheiro do contribuinte, porque todo casamento dá despesa e esse também deu. E os contribuintes têm que assistir a esta cena degradante e vexatória pela televisão: o casamento de um facínora a expensas do erário. Eu não entendo nem ao menos como é possível que existam advogados que defendem traficantes e assassinos notórios. Eu não entendo a sociedade de consumo.

Junto com a proibição universal de profanar a memória de Hitler há de vir uma lei que garanta ao condenado à morte o direito de cumprir a pena vivo. Esta, só no Brasil. Alguns assassinos não estão para ser condenados a 900 anos de prisão nesse país onde o máximo é 30? E olhe lá. Já existem penas de prisão que podem ser cumpridas em liberdade. No Brasil tudo é possível. Fazem nossos ouvidos de povo alemão em 1939, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, cujo término há 60 anos está sendo lembrado. Nesse país, os cientistas estão proibidos de salvar vidas com as células-tronco embrionárias.

- Tom!

Nada de resposta.

- Tom!

Nada de resposta.

- Onde se meteu esse menino?

E tudo que tia Polly conseguiu tirar de baixo da cama com as vassouradas foi um gato.

Tom? Deu às de vila-diogo.

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