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Opinião
11/02/2017 - 05h40
Alexandre e a tortura
Amadeu Roberto Garrido de Paula
 

Ex–aluno e ex–presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, que em determinado momento encampou posição controvertida de parte dos alunos do então professor Alexandre de Moraes, ouso desmistificar a crítica feita ao novo virtual Ministro do STF, no que tange à admissibilidade da tortura em situações limite ou extremas.

Não temos informações acerca de ter o professor Alexandre simplesmente proposto o tema, para meditação dos alunos, ou haver expressado sua posição.

Seja como for, são fortes os argumentos que justificam um ato excepcional em situação de excepcionalidade. O dilema de Kant quanto ao dogma da verdade é altamente ilustrativo. O grande pensador de Konigsberg sustentava que a verdade é um valor absoluto e que não permitia nenhuma exceção, sob quaisquer circunstâncias. Voltado a uma moralidade férrea, uma fábula deu um nó em seu pensamento. Kant está sentado num bar em sua mesa, pontualmente às 16 e tanto, em seguida ao lendário “passeio do filósofo”. Inopinadamente, ingressa no café um homem em correria, esbaforido, desesperado, diz que outro o persegue para matá–lo e se esconde no banheiro. Pede para o filósofo não dizer onde estava. Em seguida chega o homem, com a mão no gatilho. Pergunta se alguém entrou ali. Kant indica o banheiro e ouve o tiro fatal. Tranquilamente retorna a casa para dar continuidade a seus escritos transcendentais...

O exemplo levado aos alunos pelo professor Alexandre foi semelhante. Alguém, num teatro, num circo, num trem, num avião, anuncia que escondeu uma bomba, a explodir em trinta minutos, em algum ponto que se recusa a dizer. Segundo nossa Constituição, tem direito a ficar calado e a não ser submetido a tortura ou tratamento desumano ou degradante. Respeita–se a Constituição, o artefato é acionado e um genocídio se consuma num mar de sangue.

Hipóteses como essas são raras e só servem para desafiar nossa lógica. Mas é um bom exercício acadêmico e essa é a função precípua dos mestres. Sobretudo no direito constitucional. Isso porque o constituinte originário – a sociedade, o povo, regra geral em ebulição revolucionária – termina por inserir na Carta preceitos contraditórios. A solução está na axiologia, teoria dos valores, para se pronunciar o princípio mais ajustado à vontade coletivo e aos fins da Magna Carta, obviamente com sacrifício dos postulados contrários. Esse é o campo escorregadio da exegese constitucional, que não raro leva às dissidências entre os Ministros, pouco compreendidas na urbe.

Temos para nós que a tortura “in extremis”, como nos exemplos assinalados, resolve–se afirmativamente. Ela é consequência inevitável de um estado de necessidade. Estado de necessidade é excludente de criminalidade. O saudoso professor Basileu Garcia dava o exemplo do capitão e do grumete, ambos únicas vítimas de um naufrágio e à beira da morte por inanição: o Capitão acaba por comer o grumete e, por isso, não perpetrou ato ilícito. Comer pode. Torturar não...

Em verdade, a polêmica fica descolorida à luz da lei penal. “Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato: I – em estado de necessidade.” “Art. 24. Considera–se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir–se.” Vista a norma penal, dizer que o futuro Ministro defendeu tortura somente pode emanar de intensa má fé e bloqueio ideológico.

Imagine–se o que não fariam os “politicamente corretos” se o professor Basileu, hoje, fosse indicado ao Supremo. As Arcadas, nossa célula máter, ficariam estremecidas.


Nota do Editor: Amadeu Roberto Garrido de Paula é advogado especialista em Direito Constitucional, Civil, Tributário e Coletivo do Trabalho e fundador da Garrido de Paula Advocacia. É autor do livro Universo Invisível e membro da Academia Latino–Americana de Ciências Humanas.

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