Depois dos discursos ofensivos aos policiais, as autoridades capixabas partem para a aplicação dos rigores da lei. O Diário Oficial circulou com o indiciamento dos supostos participantes da greve e agora se anuncia a investigação sobre a possibilidade de haverem militares envolvidos nos crimes ocorridos no estado durante os dias de aquartelamento. É um direito do governo verificar as possibilidades, mas é ruim lançar suposições antes da certeza ou de claras evidências sobre o cometimento das faltas ou crimes. Esse mesmo rigor que o governo estadual e seus apoiadores federais hoje demonstram no cumprimento das leis deveria também ter sido observado no cumprimento patronal dos direitos da classe a coisas básicas como, por exemplo, a reposição inflacionária anual dos salários, prevista no artigo 37 X da Constituição Federal. É temerário atribuir aos militares a realização de greve ou classificar o seu comportamento como motim. Eles, submissos aos regulamentos, não fizeram greve. Apenas não saíram dos quartéis porque suas mulheres, mães e filhos bloqueavam a passagem, para chamar a atenção ao problema que vivem. Dizer que os seus familiares ali se encontravam a mando dos militares é incerto, da mesma forma que esperar deles o uso da força para retirá–los do caminho ou assistirem passivamente que outros o fizessem. Controlada a situação e recolocada a tropa na rua, o melhor que o governo do Espírito Santo tem a fazer é buscar a pacificação. Exatamente o contrário do que as primeiras medidas vêm demonstrando. Do jeito que se encaminha a questão, corre–se o risco de criar uma inconveniente divisão na tropa, colocando de um lado os punidos sob a denúncia de greve e de outro os que não forem atingidos pelas punições. Como a unidade é fundamental para o bom trabalho, isso levará a desavenças e prejuízos ao cumprimento da finalidade. Em vez de procurar onde os militares arrepiaram a lei, o governador deveria olhar para o próprio umbigo e verificar onde ele próprio foi o descumpridor e contribuinte para a situação crítica. Os governos estaduais não podem ignorar que enquanto empregadores, têm obrigações para com seus empregados. Lembrar também que investem alto na formação dos militares, trabalhadores diferenciados e especializados, operadores de um setor essencial. Se o governador Paulo Hartung e os outros governadores – pois a situação é difícil em todos os estados – insistirem em levar a questão a ferro–e–fogo, é lógico que garantirão a presença dos militares nas ruas. Mas correrão o risco de tê–los apenas como presença, em operação–padrão, cumprindo a letra fria da lei, mas evitando confrontos ou quaisquer atividades que exijam sua energia, força física ou o uso da arma e possam lhes trazer problemas funcionais ou disciplinares. Se isso vier a ocorrer, não poderão punir a tropa, pois ela estará no trabalho, mas será ineficiente e estará criado o ambiente ideal para a criminalidade... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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