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Crônicas
08/06/2017 - 06h47
Augusta, de noite
Henrique Fendrich
 

Caminhava à noite pela Augusta, que até então eu só conhecia pelo Banco Imobiliário. Voltávamos de uma espécie de barzinho, eu e duas amigas, mais paulistas que o Mário de Andrade, e elas me explicavam o que era cada coisa na rua, e eu me admirava que tanta coisa pudesse conviver no mesmo espaço. Esta São Paulo, são tantas cidades! Já eram três ou quatro dias que eu estava ali, e não cansava de me espantar: eu me sentia bem! Cheguei até a achar que se tratava apenas de uma Curitiba mais crescidinha. Devo ser a única pessoa a enxergar na cidade um certo ar provinciano. Que é a Augusta senão aquele lugar para onde todo mundo vai, aquela avenida de toda cidadezinha do interior onde se concentram os divertimentos noturnos? Era sábado à noite, caminhava pela Augusta.

No dia seguinte eu iria à feira da Liberdade, no dia seguinte um rapaz me abordaria na rua, diria que o Senhor tem planos para mim e quer que eu volte aos seus caminhos. Era São Paulo, e aquele bem poderia ter sido o meu caminho de Damasco, mas qual, sou um miserável pecador, fiz de conta que não era comigo, e continuei o meu passeio, fui até a Praça da Sé. O marco zero de São Paulo! Sou um quatrocentão, descendente dos primeiros paulistas, gente que convivia com o Anchieta, gente que recebia milagres do Anchieta, gente que tinha um dente do Anchieta como amuleto. Deve ser a genética que reverbera em mim, alguma coisa acontece no meu coração.

Seria a manhã de um domingo de sol, o Museu da Caixa Econômica estaria vazio, e da janela do sexto andar haveria um segurança olhando para baixo, de onde poderia enxergar a catedral em que o Dom Odilo, quase–papa, ministrava uma missa, mas sua atenção não estaria voltada para lá, e sim para um grupo de forró que tocava na praça, e em pouco tempo o segurança estaria cantando animadamente, até ser surpreendido por nós, visitantes do museu, e se desculpar dizendo que, se não fosse assim, morreria de tédio ali em cima. São Paulo, domingo. E esses prédios históricos, justo diante de mim? Covardia.

Mas, no sábado, nós ainda estávamos na Augusta, e era como se estivéssemos em uma rua qualquer, uma rua de uma cidade pequena onde não houvesse nenhuma possibilidade de violência, caminhávamos despreocupados, cantando e tudo mais, eu e duas moças, ou seja, três moças, pois não imagino que levassem a minha presença em consideração caso decidissem nos assaltar. Dizem que o número de boates tem diminuído, mas eu ainda achei que eram muitas. Havia também uma faculdade. Estudar na Augusta! E eu que na minha inocência nunca havia visto uma prostituta de perto, tive a oportunidade de ver várias, e quase tomei por uma delas a mulher bem produzida que vinha na direção contrária e nos abordou.

Ela disse que não era dali e estava achando aquela rua meio esquisita, cheia de pessoas estranhas, e queria saber se as casas de show por ali eram seguras. Minhas amigas disseram alguma coisa que a tranquilizou, e ela então seguiu o seu caminho e nós o nosso. Hoje eu posso dizer que, caminhando à noite pela Augusta, faço parte das pessoas consideradas normais e que podem ser abordadas por quem precisa de uma informação qualquer.

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