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Crônicas
26/07/2017 - 05h27
Final de tarde em Mauá
Henrique Fendrich
 

E de repente um final de tarde em Mauá. Onde é que eu fui dar com os meus costados? Mauá! Em Mauá eu dei o meu primeiro beijo, dei também o segundo, mas o terceiro não, que a minha moral não era para tanto. E de repente esse final de tarde, esse domingo, essa volta do cinema, dentro de um ônibus. Que filme terá sido? Isso já ninguém se lembra, um filme qualquer, um filme para a gente sair de casa, fazer alguma coisa, alguma coisa que os namorados fazem. Fugir dos olhos da mãe e do irmão! E então os dois foram, fizeram mais essa tentativa, deram-se mais uma chance, quem sabe se no cinema, só os dois, as coisas não se ajeitam! Mas agora, nesta cena, o filme já terminou, os dois estão voltando para casa dentro de um ônibus, lá fora um sol pálido, sol de outono, mas é verão.

Todas as ruas são estranhas para ele, todas as coisas são novidade, tudo é um mote, pretexto para puxar conversa, e ela explica, vai explicando, como é que se vive quando se mora em Mauá. Riem, riem bastante, mas não se pense daí que estavam se divertindo, há vários motivos para se rir, às vezes se ri de nervoso, às vezes se ri porque não se sabe o que aconteceria se não se risse. E houve um momento em que o assunto morreu e não se riu mais.

Quando percebeu, ela já estava longe. Havia virado o rosto para a janela, para o vidro, para a visão que tinha todos os dias, sempre que voltava para casa, todos os dias em que não tinha nenhum namorado sentado ali ao lado dela. Estava séria. Adivinhava o seu pensamento, de certo está pensando em nós, de certo sabia que aquilo havia sido uma loucura, que não tinha como dar certo mesmo. Ele gostaria que ela não se entregasse a pensamentos tão tristes assim, mas não teve ânimo para impedi-la. Talvez fosse melhor que falassem, deixassem as coisas às claras, resolvessem juntos o que fazer – não falaram. Ficaram em silêncio, apenas ruminando o erro que haviam cometido.

O ônibus seguia, o ônibus subia, tem muita ladeira em Mauá, e ela fez um sinal avisando do ponto, um sinal que dispensava a fala, que ali ninguém estava com muita vontade de falar. Estavam de volta, e veio a mãe, e veio o irmão, e vieram amigos, e a todos era preciso atender, e a nenhum era possível confessar o que se passava de verdade. Até uma foto obrigaram a tirar, uma foto com os dois sorrindo, os dois abraçadinhos, namorados – só que não.

Haveria de vir uma conversa, as coisas não poderiam ficar daquele jeito, mas não naquela noite de domingo, que era a véspera do primeiro dia de trabalho dela. E, na hora de se despedir e dar boa-noite, ainda parecia que havia alguma coisa, que ainda não estavam convencidos do que fizeram. Ele ficou brincando com as mãos dela – e se lembra especialmente disso: ficou brincando com as mãos dela. Ela não se importava, até gostava. Será possível que, apesar de tudo, no fim das contas, a gente... Não, isso passou rapidamente pela cabeça, mas não adiantava.

Que ela tivesse um ótimo primeiro dia de trabalho e que ele fizesse uma excelente viagem de volta. Disseram coisas assim, porque ainda não era o tempo de dizer coisas desagradáveis, um ao outro. No dia seguinte, deixou Mauá. Mauá! Onde é que ele foi dar com os costados?

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