Como o sono não chegava. O coroa insone pegou um livro pra ler, retirou o livro ao acaso da velha estante. Quando abriu o livro encontrou dentro dele um recorte de jornal todo amarelecido era um pensamento de Carlos Lacerda: “A liberdade não é um bem que se adquire ou se aluga e portanto se pode alienar ou dispensar. É um atributo do homem, uma qualidade inseparável de sua natureza”. Nada mais exato pensou o coroa insone. E riu pensando no que diriam seus amigos socialistas roxos se lessem a frase de Lacerda. Na certa diriam que era demagogia porque Lacerda sempre fora um referencial da direita e do golpismo. Mas o véio raciocinou e admitiu que a verdade independia da vinculação ideológica de quem a proclama. Além do mais a liberdade não tem cor ideológica. Mas continuou insone e sem conseguir ler, então pensou na dificuldade de sobreviver numa sociedade materialista mantendo ideais e optando pela liberdade... Talvez, pensou, fosse o caso de transigir um pouco, ser menos incisivo e mais light, mais flexível, afinal era preciso sobreviver. Foi então que se lembrou de uma charge que vira no antigo jornal O Pasquim, nos tempos da ditadura quando estava na moda compactuar com os milicos e dar como desculpa que era preciso sobreviver. Na charge alguns soldados romanos estavam pregando o Cristo na Cruz, e um soldado, justamente o que pregava o prego maior, se justificava dizendo: “Eu preciso sobreviver”. Era isso, compactuar com a exploração dos pobres era recrucificar o Cristo e se desculpar que era preciso sobreviver e, portanto, apoiar as medidas antipovo. Foi para a janela, amanhecera, era um novo dia e ele estava cansado, o sono chegara, ia sonhar com a senhora liberdade e jamais abriria mão de seus ideais. Inté.
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