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COLUNISTA
Marcelo Sguassábia
25/09/2017 - 07h15
Saudações, pobres mortais
 
 

CRIÔNICA: PROCESSO DE PRESERVAÇÃO EM BAIXAS TEMPERATURAS DE HUMANOS QUE NÃO PODEM MAIS SER MANTIDOS VIVOS PELA MEDICINA CONTEMPORÂNEA, SUPONDO-SE QUE A REANIMAÇÃO SEJA POSSÍVEL NO FUTURO.

Errou. Essa não é mais uma ficção envolvendo congelamento de cadáveres que a evolução científica consegue trazer de volta à vida num futuro distante.

Enquanto cadáver congelado eu mantenho-me lúcido e pensante, tenho consciência do que quis que fizessem comigo e da minha condição de hibernante por tempo indefinido. Não respiro, meu coração não pulsa, mas o cérebro funciona e a memória permanece tão intacta quanto todos os órgãos do meu corpo, inerte e imerso em nitrogênio líquido.

A primeira e desesperadora constatação é ter perdido a noção de quanto tempo se passou do óbito até aqui. Tudo é um breu à minha volta, provavelmente há décadas. Talvez séculos. Não o presumível breu da cápsula fechada, pois minha visão e todos os demais sentidos estão inoperantes. É a escuridão interna, o apagão generalizado do organismo, à exceção do cérebro. Ninguém sabe dessa faculdade dos criogenizados, pois ninguém jamais foi criogenizado e voltou à vida para dizer como foi a experiência. Tudo indicava que a atividade cerebral, como as demais funções vitais, cessava com o procedimento criônico. Não consideravam a possibilidade do eterno estado de alerta dos neurônios.

O sono não existe por não haver cansaço. E mesmo que o pânico em vivenciar o nada me fizesse optar pelo suicídio eu não conseguiria cometê-lo, pois qualquer movimento é impossível. A cabeça poderia até dar a ordem, mas o corpo não obedeceria. Eu teria que estourar o crânio nas paredes da cápsula e torcer para que os miolos espatifados me libertassem enfim dessa odiosa lucidez. Mas não posso me mover.

Quanto mais eu desejo não pensar, mais eu me desobedeço. São raros os “gaps” de consciência, parecem durar segundos, quando tenho a felicidade de experimentá-los.

VOCÊ, QUE ME LÊ SABE-SE LÁ EM QUE PONTO DO TEMPO, ESTRANHARÁ O FATO DESTE TEXTO PODER TER SIDO ESCRITO, CONSIDERANDO-SE A MINHA PERMANENTE IMOBILIDADE E A IMPOSSIBILIDADE DE COMUNICAÇÃO. MAS SÃO IMPRESSÕES DE UM PERÍODO DO QUAL JÁ ESTOU LIBERTO. UM TESTEMUNHO, RECONSTITUÍDO, DE UMA AGONIA QUE JÁ FOI. ME DESCONGELARAM. VIVO PARA SEMPRE.


Nota do Editor: Marcelo Pirajá Sguassábia é redator publicitário em Campinas (SP), beatlemaníaco empedernido e adora livros e filmes que tratem sobre viagens no tempo. É colaborador do jornal O Municipio, de São João da Boa Vista, e tem coluna em diversas revistas eletrônicas.
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