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SEÇÃO
Crônicas
20/11/2017 - 07h22
Prosas avulsas
José Ronaldo dos Santos
 

Por estes dias tenho notado vários grupos passando pelo meu bairro e pedindo doações. Quase sempre são grupos de igrejas, pedem para “fazer cesta básica de Natal”, para “ganhar pontos numa campanha” etc. Regular mesmo, por todo o ano, são aquelas duplas de uma determinada denominação religiosa. A seguir, apresento algumas das prosas que escutei de passagem pelos meus caminhos. Algumas delas, interessantes, são fragmentos que escutei sem querer, prosas avulsas que fiz questão de registrar seguindo o conselho de Fernando Pessoa: “tudo vale a pena se a alma não é pequena”.

Dona Veridiana atendendo duas senhoras no portão: “Ora, de novo vocês?!? É toda semana isso! Não sabem que eu sou católica e que neste momento estou fazendo o almoço? Vocês precisam considerar isso! Vocês me conhecem, sabem da minha correria. Agora me desculpem porque eu tenho mais coisas a fazer”.

Dona Eurídes foi chamada da rua. Lá de dentro, sem abrir o portão, perguntou: “Quem tá aí?”. Eram duas mulheres, acompanhadas de duas crianças: “Nós queremos falar sobre Jesus. A senhora pode nos atender?”. “Não”. Foi a resposta dessa caiçara, gente dos Barroso. E continuou: “Vocês são quantas?”. Eis a resposta que veio de fora: “Estamos em quatro: duas adultas e duas crianças”. “Então...” – continuou a humilde caiçara – “conversem entre vocês a respeito de Jesus porque eu ainda tenho muito o que fazer na minha casa; logo logo o meu marido vem da oficina morto de fome e não vai aceitar a desculpa dessa prosa sobre religião”.

Da Dona Margarida, esposa do Seo Hildebrando, ao receber duas senhoras no portão, deu os seus motivos porque era presbiteriana e não se conteve na bronca: “Usem o bom senso antes de chegar nas casas dos trabalhadores neste horário! Se vocês não tomarem jeito, logo serão chamados de seguidoras da igreja do arroz queimado!”.

Agora, o que não me sai da lembrança foi a cena no açougue do Zé Ioiô, no Perequê-mirim, onde o Zé “Canela”, um exímio desossador trabalhava. Naquele tempo qualquer estabelecimento desses tinha um toco de madeira bem resistente, entre o balcão e a geladeira, bem no centro, onde o machado estava sempre em ação, cortando os ossos do animal abatido, sobretudo as costelas que tanto sucesso faziam na sopa nossa de cada noite de inverno. Então imagine duas distintas pessoas chegando ao balcão, começando a falação, tentando converter o “Canela”, inveterado cachaceiro na época, a seguir tal religião. Assim foi a cena: com o machado na mão, debruçado sobre o significativo tronco, metido num avental todo ensanguentado, suado, ele esbravejou: “Não me venham com este papo porque eu não sou testemunha de ninguém, nem de mim mesmo! E nem quero ser um dia! Só sei que vou continuar no meu futebol e na minha pinguinha, tá bom?!? Isso eu sei que vale a pena!”. Quem é que iria continuar prosa dessa num momento assim?

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