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Opinião
02/01/2018 - 07h40
Crianças trabalhadoras
Wanda Camargo
 

Por mais racionais que sejamos, quando pensamos de modo descompromissado sobre a situação das crianças no Brasil e no mundo tendemos a sonhar; desejamos que possam brincar, estudar, se alimentar adequadamente e serem amadas, trabalho é para adultos.

Mas a realidade é complexa e cruel, não é sempre que isto ocorre: a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) divulgada pelo IBGE neste final de novembro revela que há quase dois milhões de crianças e adolescentes de 5(!) a 17 anos no mercado de trabalho brasileiro. Cerca de 30 mil crianças entre 5 e 9 anos de idade estão trabalhando, entre 10 e 13 anos são aproximadamente 160 mil crianças trabalhadoras. Em nosso país, no século XXI.

Crianças sempre trabalharam, a princípio como ajudantes em tarefas simples, na agricultura e na pecuária sua participação gerou até inúmeros contos populares como “Pedro e o Lobo”, em que um pastor de ovelhas, certamente criança, imagina maneiras de brincar enquanto trabalha, com mau resultado. Da área rural portuguesa nos vem um dito do começo do século vinte: “o trabalho do menino é pouco, mas quem não o usa é louco”, é absurdo, mas era a sabedoria vigente.

A Revolução Industrial, com o desenvolvimento de máquinas que diminuíam a necessidade de força física para a operação, permitiu o emprego do trabalho de mulheres e crianças que, evidentemente, recebiam menores salários do que os demais trabalhadores, ocasionando sua demissão ou redução salarial; como consequência os pais traziam toda a família para a fábrica, tentando compensar as perdas de receita e conseguir sobreviver. Um censo da Inglaterra dos anos 1860 mostra que mais de 35% dos meninos e 20% das meninas eram trabalhadores, mais de um terço dos trabalhadores na indústria têxtil era menor de 18 anos, e em mineração de carvão, uma das mais insalubres e perigosas atividades profissionais, um quarto dos trabalhadores era menor de idade. E isso não era privilégio inglês, nos Estados Unidos e na França a realidade era parecida, com elevadas taxas de crianças trabalhando.

No Brasil, o trabalho infantil era parte da escravidão, os filhos dos escravos participavam das atividades de seus pais, e foram comuns as constatações de crianças e adolescentes obrigados a realizar tarefas para as quais não tinham capacidade física ou preparo para evitar acidentes. A incipiente industrialização do país, no fim do século dezenove, reproduziu o modelo de outros países e o utilizou largamente, quase 40% dos trabalhadores em fábricas na cidade de São Paulo era constituído de crianças e adolescentes.

Muitos escritores e pensadores do século dezenove discutiram o tema, Charles Dickens escreveu vários romances em que as condições de trabalho e sociais desta época são bem descritas. Após isso, a questão pareceu desinteressar os acadêmicos até os anos 1990, quando passou a ser parte de uma agenda humanista voltada à redução da pobreza e melhoria da qualidade geral de vida. Surgem então diversas políticas nacionais e internacionais ligadas à redução do trabalho infantil, as principais delas foram a da ONU para o Direito das Crianças (1989), a da Organização Internacional do Trabalho que visa a eliminação das piores formas de trabalho infantil (1999), e a Declaração do Milênio que enfatiza a redução da pobreza e a educação universal (2000). No Brasil, a Emenda Constitucional nº 20 (1998) estabelece a idade mínima de 16 anos para que um adolescente possa trabalhar, em ocupações não insalubres, perigosas ou que lhe tragam riscos morais; entre os 14 e 16 anos poderá trabalhar no estatuto da Lei de Aprendizagem.

Mesmo considerando que a análise estatística sobre este assunto deve ser feita com bastante critério para evitar a sub ou sobrestimação de valores, pois o trabalho infantil pode ser intermitente ou sazonal, principalmente em áreas agrícolas; e ainda a questão do trabalho domiciliar praticado principalmente por meninas que cuidam da casa enquanto a mãe trabalha fora, os dados são preocupantes. Mesmo com a existência dos casos em que as tarefas da criança não é propriamente trabalho, apenas um auxílio aos pais realizado poucas horas por semana e que não prejudica suas demais atividades de estudo ou brincadeiras, um país sem injustiças e desigualdades extremas precisa inserir suas crianças no sistema educacional, e não precocemente no mundo do trabalho.


Nota do Editor: Wanda Camargo - educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil - UniBrasil.

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