14/09/2025  10h48
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Opinião
11/07/2005 - 09h52
A crise é o que menos preocupa
Alexandre Furlaneto - MSM
 

Nestes dias em que a mídia e a opinião pública voltam suas atenções para as denúncias sobre a corrupção nos Correios (e possivelmente em outras estatais, como o IRB), sobre o "mensalão" e sobre as CPMIs instaladas, confesso ao leitor que o que menos me preocupa são as evidências de corrupção ou os possíveis desdobramentos das Comissões e seus efeitos sobre a governabilidade e a estabilidade do País. Sobre as denúncias, se não fossem essas seriam outras. Faz tempo que o PT descobriu o realismo político. Além disso, o esgoto sempre correu a céu aberto e, se de tempos em tempos, alguém relembrar este fato é algo que, infelizmente, se tornou crônico na nossa história política e está longe de ser reparado. Sobre a CPMI dos Correios, Presidência e Relatoria já estão controladas e alinhadas com o Palácio do Planalto. Em outras palavras: a lenha já está queimando, o forno esquentando e daqui a pouco a pizza começa a ser assada para, posteriormente, ser empurrada goela abaixo da Nação.

O que realmente me preocupa é um possível desdobramento para o qual, até agora, não se deu a devida atenção. Vejamos: após a divulgação das denúncias, das entrevistas de Roberto Jefferson e da correria para a instalação da CPMI, aos poucos se começou a vender para a população a nova panacéia, aquilo que vai curar e redimir o sistema político brasileiro de todos os seus males e pecados - a reforma política.

A história voltou à baila numa tradicional manobra do PT para passar de acusado a acusador. Era preciso usar a "crise" como uma oportunidade. Se não me engano, foi Olívio Dutra o primeiro a sair falando sobre isso. O mais incrível é que o primeiro a segui-lo não foi nenhum assecla lulesco, mas o Senador Arthur Virgílio (PSDB), dizendo que se o governo apurar as denúncias e punir os culpados, o PSDB estaria disposto a colaborar com uma "agenda positiva" para o País. O círculo se fechou quando, no mesmo dia das declarações, a Rede Globo começou a divulgar a panacéia. E reparem no seguinte detalhe: a reforma política nunca é explicitada, debatida ou confrontada, é apenas vendida como benéfica, positiva, redentora - um avanço para o Brasil. É a tradicional manipulação semântica descrita por Schopenhauer, é a já conhecida erística sem debate, tão eficiente em uma sociedade de aparências como a nossa.

Antes de começar a explicar o que contém a panacéia da centralização, digo, reforma política que querem lhe empurrar, explico porque ela é inócua para resolver os problemas de corrupção que tomam a mídia atualmente. Os desvios de verba nos Correios têm dois objetivos básicos: (a) enriquecimento ilícito dos envolvidos (e aqui se incluem os padrinhos) e (b) formação de caixa para campanha.

Para o primeiro objetivo (a), os dois fatores que permitem sua existência são, primeiro, o desproporcional poder da burocracia frente ao cidadão - e sempre que a burocracia e o cidadão entrarem em contato direto, a possibilidade de acertos espúrios existirá. Os únicos meios de a corrupção diminuir seriam promover a transparência, o controle interno e externo das estruturas burocráticas e o aumento dos meios de defesa, e de suas respectivas eficácias, do cidadão frente à máquina burocrática. Lembrando Hayek, o que faz uma sociedade democrática não é a fonte nem a forma de acesso ao poder, mas os meios como ele é limitado e impedido de ser exercido de forma arbitrária. O segundo fator que colabora com a corrupção é de ordem político-administrativa: as funções superiores e médias da burocracia são exercidas por pessoas indicadas politicamente, na tradicional prática clientelista brasileira. Só no governo petista, os autoproclamados proprietários da ética nomearam quase 20.000 pessoas para cargos de confiança, acirrando a prática nacional de fazer a máquina pública responder muito mais ao partido do que ao Estado ou à sociedade. E quando algum dos "privilegiados" nomeados para um alto cargo público "cumpre" a função de ajudar a financiar a próxima campanha o problema central não reside na atual forma de financiamento eleitoral prevista na lei, mas justamente nos expedientes utilizados para burlar esta legislação. Ou será que alguém imagina que os recursos oriundos de desvios dos cofres públicos vão, no futuro, ser simples e candidamente declarados no caixa de campanha? E se algum "impertinente" resolve perguntar e verificar de onde os recursos vieram? Alguns trabalhos defendem que o "caixa 2" de campanha chega a representar 10 vezes o valor do caixa oficial. Reafirmo: não é a forma de financiamento prevista na lei que é o problema, são os meios pelos quais se burla a lei - e o escasso controle e punição que os acompanham.

Dito isto, vejamos o que a panacéia do momento esconde. Os pontos básicos da reforma política, e para os quais já existe consenso entre PT, PSDB, PMDB e PFL são basicamente dois: (1) cláusula de barreira e (2) financiamento público de campanhas eleitorais.

A cláusula de barreira estipula que para que um partido tenha funcionalidade legislativa, ou seja, possa trabalhar nas Casas Legislativas, é preciso obter 2% dos votos válidos apurados, com 1% de votos em pelo menos um terço dos Estados da Federação. Já o financiamento público determina que em ano eleitoral, a lei orçamentária e seus créditos adicionais incluirão dotação de R$ 7,00 multiplicados pelo número de eleitores alistados até 31 de dezembro do ano anterior à elaboração do orçamento para composição do Fundo Partidário. Atualmente, isso significa que a cada ano eleitoral, os contribuintes pagarão aos partidos algo em torno de R$ 800 ou R$ 850 milhões para financiar a campanha eleitoral. É a inesgotável cornucópia dos cofres públicos brasileiros funcionando!

A coisa não pára por aí. Os recursos do Fundo Público serão distribuídos da seguinte forma:

- 1% dividido igualitariamente entre todos os partidos com estatutos registrados no TSE;

- 14% divididos igualitariamente entre os partidos com representantes na Câmara dos Deputados;

- 85% divididos entre os partidos proporcionalmente ao número de representantes que elegeram na última eleição para a Câmara dos Deputados.

Unindo este sistema de financiamento e a cláusula de barreira com o atual sistema de divisão do horário eleitoral, e fazendo um simples exercício sobre os desdobramentos desse conjunto, pode-se imaginar aonde isso vai nos levar: a cada eleição os partidos maiores terão mais dinheiro, mais tempo de rádio e TV e aumentarão sua hegemonia até que os partidos menores não consigam sequer obter funcionalidade legislativa. Traduzindo: em poucos anos aqueles brasileiros que pretenderem concorrer a um mandato eletivo, participar da vida político-partidária do País, terão que obter, primeiramente, o aval de três ou quatro grupelhos que dominarão o sistema partidário. Será que a democracia será fortalecida ao se centralizar em pouquíssimos grupos e caciques as formas de ação político-partidárias? Será mesmo uma vantagem ter três ou quatro grupos se revezando no controle de todos os cofres públicos do País?

Agora, depois de explicado o que a "redentora" centralização, digo, reforma política contém e o assalto à democracia que se pretende, voltemos ao ponto de partida deste artigo, as CPMIs, e poderemos prever seus efeitos: os partidos menores serão cuidadosamente implodidos, com alguns de seus membros sendo executados politicamente e oferecidos ao populacho como exemplo do combate à corrupção. Longe da vista da opinião pública, a reforma política centralizadora vai caminhando em silêncio, fortalecendo PT, PSDB, PMDB e PFL. Em pouquíssimo tempo, de acordo com a necessidade de composições, acredito que esses quatro grupos tendem a se reduzir e o eleitor, a cada pleito, terá que escolher entre centro, centro-esquerda e esquerda. Um fantástico exemplo do que se consegue fazer com a democracia nesta terra onde o tempo corre ao contrário.

PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "OPINIÃO"Índice das publicações sobre "OPINIÃO"
31/12/2022 - 07h25 Pacificação nacional, o objetivo maior
30/12/2022 - 05h39 A destruição das nações
29/12/2022 - 06h35 A salvação pela mão grande do Estado?
28/12/2022 - 06h41 A guinada na privatização do Porto de Santos
27/12/2022 - 07h38 Tecnologia e o sequestro do livre arbítrio humano
26/12/2022 - 07h46 Tudo passa, mas a Nação continua, sempre...
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.