Muitas confissões religiosas, inclusive a que comungo, e mesmo alguns intelectuais liberais, se manifestam contra o uso de métodos anticoncepcionais ou de políticas de controle de natalidade por alegarem que Deus quis que assim fosse ou, chegando a raias de afirmações esdrúxulas dizendo que tais práticas seriam "anti-cristãs". Exemplo disso foi uma crônica que li da autoria de José Nivaldo Cordeiro onde o mesmo dizia (faço aqui uma menção de memória) que seria um absurdo a realização de uma política de controle de natalidade por parte do Governo, pois tal atitude seria um germe de totalitarismo e que, o que leva uma família a ter vários filhos seria simplesmente o desejo de tê-los e nada mais. Desculpe-me a franqueza, mas isso é de um simplismo sem tamanho. De mais a mais, liberais de grande quilate como Roberto de O. Campos defendiam como ponto fundamental para a solução dessa confusa equação chamada Brasil um amplo controle de natalidade. Inclusive, em uma de suas entrevistas concedida à Folha de São Paulo disponível no site PENSADORES BRASILEIROS, O. Campos dizia que uma das coisas que ele sente de não ter conseguido convencer os militares terem empreitado, foi justamente o dito controle da natalidade. Mas voltemos aos "argumentos religiosos". Comumente ouvimos a afirmação que não se deve usar métodos anticoncepcionais porque seria contra a vontade de Deus e que nós devemos ter tantos filhos quanto Ele nos enviar. Ótimo! Mas aí eu me pergunto: é da vontade de Deus que uma mãe negue comida para a sua filha? É da vontade do Pai que um pai gaste todos os seus ganhos em um cabaré chulo enquanto deixa a sua prole perecer? É da vontade de Adonay que uma mãe use sua prole para fins econômicos e que os trate como seus pertences? Creio que isso tudo nada mais é que fruto da maldade e da ignorância dos homens não da benevolência do Altíssimo. E, de mais a mais, esses exemplos que citei não são hipotéticos, mais sim, bem reais, os quais, conheço de perto. Por isso digo que uma política séria de controle de natalidade juntamente com uma campanha séria sobre maternidade e, principalmente, paternidade responsável, ajudaria em muito para que pudéssemos nos libertar dessa maldição de Malthus. Por fim, discordo que tal postura seja uma política totalitária. Não estamos falando em aborto compulsório. Estamos falando simplesmente em responsabilidade no ato de gerar e criar crianças. Proto-totalitário seria justamente esse estado em que se encontra a nossa nação, com uma geração praticamente inteira sendo criada e educada pelas ruas, pela programação dos canais de televisão e arrebanhados por ideólogos oportunistas de plantão.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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