As investigações que monopolizam a pauta nacional deixaram mais uma vez expostas lacunas de uma agenda interrompida. Tomemos um exemplo extremamente atual. Se determinada licitação foi decidida dentro de uma estatal ou órgão público em favor de uma empresa ligada a um esquema para favorecer determinado grupo de políticos, possivelmente ocorreram algumas ou todas as situações descritas abaixo. Primeiro, é provável que o benefício indevido àquela empresa esteve amparado numa interpretação legal que autorizava a prática. À primeira vista, o problema pareceria ser sanável mediante aperfeiçoamento na legislação de licitações para anular a interpretação distorcida e inibir a possibilidade desse tipo de fraude. A questão, entretanto, é mais complexa. Muitas vezes o problema não está na legislação em si. Com freqüência, o argumento da "defesa do interesse público" é esgrimido para extrapolar os limites da legislação, com o intuito de beneficiar indevidamente este ou aquele licitante. Segundo, é plausível que a fraude tenha sido praticada como contrapartida de favorecimento econômico a políticos, pagamento de compromisso contraído em campanha eleitoral, compra de "governabilidade" e tantas mais situações que a imaginação sequer alcança. Estas constituem, resumidamente, algumas das fragilidades de um sistema político que talvez não seriam totalmente sanadas, mas ao menos minimizadas, por meio de uma profunda reforma, infelizmente ainda distante. Nessas deploráveis aventuras de licitações fraudadas, saques milionários e malas generosamente recheadas, sobressai outro componente. Os recursos não-declarados geralmente estão associados à sonegação e à informalidade. É claro que o ânimo de cometer fraude não é motivado pelo peso dos altos impostos ou dos elevados encargos sociais. Mas se uma ampla reforma fiscal e tributária possibilitasse uma efetiva redução dos tributos e encargos, certamente não haveria tantos recursos ilícitos disponíveis voando por aí, o que facilitaria a vigilância. Um elemento aparentemente marginal, mas que também acaba entrando nesse caldo, é a burocracia. Aqui novamente não há uma relação direta de causa e efeito entre burocracia e fraude. Mas o excesso de burocracia gera custos absurdos e também desestimula a formalidade. Certamente, a desburocratização elevaria a competitividade das empresas, constituindo-se numa relevante arma de combate à informalidade e à sonegação. Enquanto todas essas reformas não vêm, o melhor a fazer é buscar revestir todos os atos públicos do máximo de transparência. Ao mesmo tempo, pouco avançaremos se a nação ficar atenta apenas àquilo que os holofotes midiáticos iluminam, sem pressionar pelas reformas que certamente subtrairão oxigênio à prática daqueles ilícitos. Nota do Editor: João Claudio Robusti é presidente do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo).
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