Todos que, como eu, têm o privilégio de uma vida longa e participativa, mesmo sem querer, estão preocupados com o momento político-institucional brasileiro e as prováveis consequências. O Supremo Tribunal Federal avalia a mudança de jurisprudência que pode libertar os condenados em segunda instância, transferindo o cumprimento de suas penas para depois da sentença transitada em julgado ou, ainda, para após o julgamento de terceira instância. A medida recebe severas críticas e interpretações e causa inquietação a significativos segmentos da sociedade, como os caminhoneiros, que prometem parar novamente o país. Setores radicalizados pregam abertamente a quebra institucional através da intervenção militar que, pela Constituição, deve ser o último remédio, quando todos os demais se tenham mostrado ineficazes para conter o caos. Quem conhece a história da república brasileira e teve a oportunidade de viver o fechamento e a abertura dos anos 60/80 e a sui generis democracia implantada e vigente nas últimas décadas, só pode se preocupar. Segmentos políticos e institucionais parece ignorarem o fim da guerra fria, a queda do muro de Berlim e o esfacelamento da União Soviética e, comisso, ainda investem na polarização direita-esquerda. Centenas, talvez milhares de políticos e ativistas feitos réus ou cúmplices em razão de más práticas, principalmente a corrupção, potencializam a discórdia e o infindável clima disputa eleitoral. Todos os atores desse teatro de horrores parece agirem como se não houvesse amanhã. Acusam-se mutuamente e ocupam-se prioritariamente na desconstrução do adversário, pouco se importando com os riscos dessa contenda. A instabilidade se reflete na Economia, que tem empuxos de decolagem, mas é ferida pela crise político-institucional. Ao cidadão comum, que nada pode fazer para mudar o quadro, só resta esperar que as lideranças atuem com bom senso e coloquem os interesses nacionais acima dos próprios e dos de grupos. Os ministros do STF, acima do seu saber jurídico, precisam avaliar a repercussão de suas decisões na sociedade atual em vez de simplesmente interpretar a fria letra da lei, escrita hipoteticamente décadas atrás. Os membros do Executivo, Legislativo e dos órgãos institucionais também haverão de encontrar a forma menos traumática para a solução dos impasses de forma a beneficiar a Nação e não apenas a segmentos em luta pelo poder. O perigoso do momento é que todos parecem cheios de definitivas certezas e razões. É bom pensarem se para o Brasil e, principalmente, para o povo, será mais produtivo vencerem as opiniões de uns e outros ou se buscar o consenso possível que possa preservar vidas e modular interesses. Afinal, a vida em sociedade é a grande convenção onde todos reconhecem e respeitam o princípio básico de que o direito um começa onde termina o do outro e que, ainda, existem os valores comuns a serem cultivados e mantidos... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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