A prática na China se chama “Paotui”: um sujeito paga outro para guardar lugar na fila. Quando chega a vez do fileiro de aluguel, este passa mensagem por celular para o comprador do serviço - que chega em 5 minutos para assumir seu posto, disposto e de banho tomado. De bico emergencial para desempregados, a coisa se profissionalizou e virou business, com uma penca de empresas especializadas. Daqui a pouco tem até rede de franquias. Não deixa de ser paradoxal o sucesso do negócio. Num mundo repleto de facilidades e conveniências, atendimentos pré-agendados com hora marcada e delivery de tudo o que se possa imaginar, a ideia de uma fila de pessoas debaixo de nevasca ou de sol inclemente é neandertalesca. A fila da sopa de morcego. A fila do espetinho de vaga-lume crocante. A fila do cachorro quente feito de cachorro mesmo. A fila de cadastramento biométrico para reconhecimento facial. E, claro, a já célebre fila para a última geração do iPhone. Depois de um dia inteiro + 22 horas e meia guardando lugar para um Apple-fan, Zhao Tsua não resistiu à oferta de um abonado de Xangai que o assediou quando restavam apenas cinco Chan Chin Chons à sua frente, oferecendo 50% a mais para vender o seu lugar a ele e passando a rasteira no antigo contratante. Zhao Tsua pegou sua maleta abarrotada de yuans e #partiuprabemlonge, além-Muralha, a salvo da ira do sujeito a quem havia traído. Apesar do coronavírus que esvazia eventos, celebrações de Ano Novo, ruas e cidades inteiras, o boom desta nova oportunidade de negócio vem provocando filas para entrar na fila dos que querem ser fileiros. Xin shídài. Novos tempos, em chinês. Esta é uma obra de ficção.
Nota do Editor: Marcelo Pirajá Sguassábia é redator publicitário em Campinas (SP), beatlemaníaco empedernido e adora livros e filmes que tratem sobre viagens no tempo. É colaborador do jornal O Municipio, de São João da Boa Vista, e tem coluna em diversas revistas eletrônicas.
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