Porque nunca tivemos ocasião de ser informados e de pensar sobre certos temas essenciais à política e ao exercício da nossa condição de cidadãos, acabamos confundindo as coisas de maneira desastrosa. Assim, por exemplo, confundimos democracia com república. Essa confusão é tão evidente que se o leitor tiver prestado atenção, perceberá que as lideranças petistas passaram a se referir a valores republicanos como sinônimo de valores da democracia. Mas são coisas diferentes. República é forma de governo. Democracia é regime político. Da mesma forma, para nós, chefia de Estado, governo e administração são a mesma coisa, embora a mais elementar apostila que trate do tema dirá que são entes distintos e as constituições dos países mais lúcidos os reconheça como tal. Andamos na contramão, convencidos de que democracia se faz assim como fazemos, só pode ser feita segundo o modelo que adotamos e, por conseqüência, se mudar, deixará de ser democracia. O presidente da República tem que ser chefe de Estado, de governo e da administração. Aí, quando ele viaja como chefe de Estado, reclamamos que ele tem que estar aqui como chefe de governo. Quando ele começa a nomear dezenas de milhares de cargos de confiança na administração, o acusamos de se valer do que é público em benefício do partido. Quando ele se elege sem maioria parlamentar, o resultado é conhecido: ou se suicida, ou renuncia ou é deposto. Quando compõe maioria parlamentar é um negocista e um corruptor. Mas quem está errado é ele ou quem age contra ele. O modelo, para nós, está perfeito. Democracia é assim que se faz. Aí fico me perguntado: a Alemanha, a Itália e a França não são democracias? Engraçado, nesses países e em muitos outros, o chefe de Estado não governa e é eleito por voto direto, enquanto o chefe do governo é designado pela maioria parlamentar. E o que dizer da Holanda, da Bélgica, da Noruega, da Suécia, da Dinamarca, da Espanha, da Inglaterra, da Escócia, do País de Gales, da Irlanda, da Austrália e do Canadá? Não são democracias? Muito boas, por sinal? Pois nesses países, o chefe de Estado é um monarca e o chefe de governo é apontado pela maioria parlamentar. No entanto, persistimos na convicção de que democracia boa, de qualidade, competente, eficiente e eficaz é a que se obtém com o modelo que adotamos no Brasil, na Argentina, no Paraguai, na Bolívia, na Venezuela, na Colômbia, no Peru, no Equador e tutti quanti. Está bem. O errado sou eu. Nota do Editor: Percival Puggina é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.
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