Um dia eu estava numa dessas palestras de auto-ajuda. Sabe essas, que os caras vêm não sei de onde, patrocinados por um monte de empresários da cidade, e que as empresas obrigam seus funcionários a irem? Então, era uma dessas palestras. E lá, durante a palestra, o palestrante abriu espaço para perguntas da platéia. Ele pediu para que quem tivesse perguntas se levantasse, dissesse o nome e profissão, e então que fizesse a pergunta. E os caras foram levantando. O primeiro que levantou falou que era o João Pedro, balconista de uma loja de sapatos, e fez uma pergunta. Depois levantou a Lindaura, professora de escola pública, e fez a pergunta dela. Depois levantou um sujeito engravatado, digamos, o Astolfo, disse que era advogado e tascou também a sua pergunta. E aí levantou um sujeito magro, olhos fundos. - Boa noite, eu sou o Guilhermino. Eu sou filósofo. Eu fiquei olhando para o Guilhermino, meio assustado. Como assim, filósofo? No fim da palestra, eu me aproximei e, como quem não quer nada, dei uma cutucada na barriga dele com meu dedo indicador. - Ei, mas o que é isso? - Puxa, você existe mesmo! - Do que é que você está falando? - Um filósofo, em carne e osso! - Pois é claro que sou, porque, nunca viu? - Pra falar a verdade, não. - Pois sou filósofo, sim senhor. Formado e tudo o mais. - Nossa! E o que você faz na vida? - Como assim o que eu faço na vida? - O que você faz assim, quando acorda, por exemplo. Você acorda e já começa a filosofar? - Você tá tirando uma com a minha cara? - Não, é claro que não, é que eu sempre quis conhecer um filósofo. - Mas um filósofo é um cara como qualquer outro, oras. Aliás, todo mundo é um pouco filósofo. - Nossa, que profundo isso. Posso anotar? - Tem certeza que você não tá de gozação? - É claro que eu tenho. Inclusive, eu queria pedir uma coisa. - Fala, ué. - Será que eu posso ser seu discípulo? - Meu o quê? - Discípulo. Todo filósofo tem um discípulo, não tem? - Hum, sei lá, acho que isso acontecia sim, mas muito antigamente. - Mas eu queria tanto ser seu discípulo, deixa vai... - Tudo bem, tudo bem. Mas vê se não me atrapalha, hem? - Pode deixar, você nem vai perceber que eu tô te seguindo. Eu ainda segui o filósofo por umas três ou quatro quadras. Depois enjoei, desviei numa esquina e fui embora pra minha casa. Um filósofo, veja você...
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