Órgão de cobertura durável, mutável, maleável, permanente desde antes do princípio e até após o último suspiro. Uma armadura de metal não ofereceria proteção mais eficiente, e é por isso que nossa pele não é feita de ouro. Se houvesse tal necessidade, é absolutamente seguro que a Natureza a teria suprido, como fez em outros arranjos bem mais complexos, e então seríamos criaturas brilhantes, douradas, pesadas e claudicantes. Basta olhar através do microscópio para perceber que a pele é um milagroso composto orgânico, cuja estrutura mostra-se muito mais intrincada que uma simples malha de átomos de ouro. A pele é, talvez, o órgão mais surpreendente do corpo humano (sem chance para o cérebro, já que ele próprio não se define), e quando estendemos seu estudo a outras espécies de animais, podemos mesmo elevá-la ao nível do maravilhoso. Uma armadura de ferro, após o primeiro banho, saindo ao sol, começaria a enferrujar até sua completa desintegração. A pele, ao contrário, solta seus grânulos de "ferrugem" junto com a água do banho, substituindo-os por substâncias vivas, no interior e na membrana de suas células. Em conseqüência, mesmo aquelas pessoas de peles macilentas, que passaram os últimos anos entregues ao álcool ou ao cigarro, que parecem velhas, doentes, fadadas a uma rápida declinação, vêem-se rejuvenescer após uma dieta de água e frutas. Células com alto grau de diferenciação exercem simultaneamente múltiplas funções para dar à nossa pele suas nobres propriedades do rejuvenescimento, da maleabilidade, da regeneração dos cortes e outras feridas, proteção contra impactos, coloração adequada aos ambientes ou aos humores do espírito. Depois do banho, logo que necessário, a pele recobre-se de uma camada protetora, expelida pelas glândulas, e é também através dela que o corpo elimina muitas impurezas, junto com o suor, dando fôlego às outras vias de excreção. Além de tudo, a pele é sensível ao toque, à sensação de presença, à recepção do outro, à abertura para um primeiro encontro. É o palco de inúmeras deflagrações, começando pelo reconhecimento de um invólucro desejável, o cheiro, o tato, o beijo e um caminho para o êxtase. A pele traduz as oferendas ao coração, as alegrias cor-de-rosa, o vermelho da vergonha, o susto pálido, o gelo do medo, a rugosidade do frio, os amarelos amargores... e não se verá pele mais sedosa, colorida e vibrante que a daqueles que se entrelaçam na saudável dança do amor. Nestas noites de inverno, apenas quem tem pele pode dar-se ao luxo de receber o conforto de um corpo caloroso... ou sentir, através dela, o frio da ausência, e essas coisas que não se dão a uma calculada fisiologia.
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