As noites do sertão são lindas, grandes, imensas, poéticas, nostálgicas, orantes, pedintes. São portas que se abrem ao alto para, em direção ao luar, buscar os encantamentos da noite e da vida. Quando as noites chegam e seu manto vai encobrindo a terra com suas cores sombreadas e escurecidas, logo as chamas do candeeiro da lua se acendem para tudo recobrir com seu dourado de paz e encanto. A muitos, que apenas tratam a noite como parte escurecida do dia e a lua como o oposto do sol, tanto faz que após o entardecer os horizontes se encham de fogo e magia, e que os encantamentos surjam em cada raio de luar e em cada estrela que vagueia brilhosa pelos espaços. Nada entendem de noite, de lua, e muito menos de luar sertanejo. Certamente não sabem que a lua carrega em si o dom da transformação e em cada dourado que espalha há um descortinar de sentimentos sem fim. Igualmente não sabem de quanta simbologia há num clarão de luar sertanejo. No sertão, o luar não é de lua qualquer, não é apenas um astro noturno que brilha, não se contenta em ser somente uma luz clareando na noite. O luar do sertão é sentimento aceso em fogo e brasa, é chama que reacende saudades, reencontros e recordações. O luar sertanejo crepita por dentro como tição e fagulha, como labareda e faísca. E tanto queima que é preciso cuidado ante sua luz. Somente a luz do luar sertanejo para afastar as medonhices da noite e os medos dos esquecimentos. Impossível não abrir janelas, não reabrir velhos álbuns, não buscar fotografias, não reencontrar imagens de faces e feições, perante a luz que brilha lá em cima. Nas noites do meu sertão, nada mais preciso que a luz do luar. Nas noites do meu sertão, meu coração só quer luar. E no luar o retrato vivo daquilo que sinto saudade, que amo, que merece ser recordado. Nas noites do meu sertão, quando a lua se abre em flor, então os jardins da memória começam a brotar suas pétalas. Olhar para o alto e se encantar com o amarelado da lua, avistar a luz imensa perante a escuridão, tudo isso conforta a alma e o espírito. Nas noites do meu sertão, quando os silêncios chamam à reflexão, nada melhor que compartilhar da voz interior com a auréola iluminada que desce do alto e a tudo envolve. Uma lua tão bela e sertaneja, tão cheia de palavras e vozes, que o silêncio se transforma em poesia e encantamento. Bem disse o poeta: “Não há, oh gente, oh não, luar como esse do sertão...”. E digo mais: Uma luz que pacifica a alma, uma cor que enobrece o ser, um brilho que envolve todo o coração. Na noite, nos altos e nas alturas da noite, é como se as recordações chegassem com a luz do luar. Um cheiro de café torrado, um cheiro de fogão de lenha. Vagantes vaga-lumes, réstias de candeeiros, fagulhas ainda vivas das fogueiras do tempo. E uma canção no vento. Um vento que vem das montanhas, lá detrás dos montes enluarados, trazendo a cor da lua e o brilho das estrelas e para, perante o meu silêncio noturno, ecoar uma linda canção de amor. De amor ao sertão. De amor à sua lua, ao seu luar. Nota do Editor: Rangel Alves da Costa é poeta e cronista. Mantém o blog Ser tão / Sertão (blograngel-sertao.blogspot.com.br).
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