A maioria das pessoas reclama de solidão. E há até os que enxergam solidão nos outros, mas não vêem as suas próprias. Criou-se na sociedade urbana atual um verdadeiro aparato para proteger a nossa privacidade. Temos carros com vidros escuros, travas elétricas, alarmes e até blindagem. Usamos telefone que recebe mensagens, ligações, mas tem bina para triar com quem achamos por bem falar. As casas têm porteiros eletrônicos, cercas protetoras, grades, muros altos e cães ou vigias. O edifício tem vigias, vigilância eletrônica, interfones, câmeras e até os elevadores têm códigos ou chaves. As empresas são ou imaginam ser verdadeiras cidadelas. Tudo trancado, confinado, filmado. A cada dia, as pessoas vão isolando-se mais. Para alguns, o trajeto no elevador, em que o vizinho é companhia eventual, parece um tempo demasiado longo quando são apenas segundos. Trocam meros cumprimentos, se trocam. Há até os que entram no elevador, não enxergam o outro e ficam olhando para o infinito que esbarra na porta a centímetros dos seus narizes. O outro é o morador do 201 e não o fulano. A outra é aquela moça do carro cinza e sem nome. E, no mesmo prédio, podem morar solidões a procura de companhia e ai os sites de amizades virtuais imaginam substituir as relações vivas entre gente de carne e osso. Lembro da minha casa da infância e juventude de porta sem chave, carro sem trava, irmãos entrando e saindo, vizinhos pedindo para dar um telefonema ou trocando gentilezas. Hoje, as pessoas quedam-se no silêncio, extravasam seus problemas no consultório de analistas ou na ilusão da bebida em bares e restaurantes onde o barulho do som embota as conversas. O ombro amigo, aquele que ouve e cala, vai ficando longe da realidade. Não se confia, não se confidencia, não se fia. E aí se poderia objetar que a pessoa amada deveria ser esse confidente. Na verdade, seria bom se assim fosse, mas não é a regra geral. Mostrar "as fraquezas" poderá ser fatal e aí não se desce à essência e os dois vivem em mundos paralelos e dessemelhantes. Há saída? É claro que deve haver e isso vai depender de cada um admitir que o outro é alguém parecido com ele, padecendo dos mesmos males e ansiando por ter com quem possa trocar dois dedos de conversa ou de afagos sem medo de retaliações ou censuras, pois as nossas vidas, mesmo que não queiramos, acabam enredadas nas teias dos relacionamentos. Há um provérbio que diz: "Não declares que as estrelas estão mortas só porque o céu está nublado." Assim, espere que as nuvens passem e descubra as estrelas.
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