14/09/2025  06h08
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Opinião
22/09/2005 - 10h04
O angu brasiliense
Dartagnan da Silva Zanela
 

Se você quer entender qual foi o caminho trilhado pela experiência civilizacional brasileira para chegar no cume pútrido em que chegamos, deverá por obrigação cívica ler algumas obras que procuram explicar o que aparentemente não tem explicação. Sugiro, primeiramente, a leitura da obra RAÍZES DO BRASIL do historiador Sérgio Buarque de Holanda.

Para Buarque de Holanda, "Em sociedades com origens tão nitidamente personalistas, como a nossa, é compreensível que os simples vínculos de pessoa a pessoa, independentes e exclusivos de qualquer tendência para a cooperação autêntica entre os indivíduos, tenham sido quase sempre decisivos. As agregações e relações pessoais, embora por vezes precárias, e, de outro lado, as lutas entre facções, entre famílias, entre regionalismos faziam dela um todo incoerente e amorfo".

Quando voltamos as nossas vistas para a nossa volta, as palavras do finado historiador se fazem claras como água cristalina da bica. Não falemos aqui, dos conluios que se fazem espetáculo no planalto central, mas sim, das conjurações oportunistas que estão a nossa volta e que, em boa parte das vezes, nós, "cidadãos" brasileiros, estamos envolvidos direta ou indiretamente.

Quando pensamos as relações de poder locais, em especial nos agrupamentos humanos do interior do Brasil, não estamos mais diante de partidos políticos formado por pessoas que estejam convictas das plataformas ideológicas apresentadas pela sua sigla, mas sim, frente a uma estrutura "pré-ideológica" como bem nos aponta Victor Nunes Leal, em sua obra CORONELISMO - voto e enxada.

Ou seja, quando vemos os partidos políticos organizados em cidades interioranas, vemos com clareza o desaparecimento da identidade ideológica substituída pela imagem de uma família ou, de um grupelho de pessoas organizados em torno da imagem de um cacique eleitoreiro e a isso, passamos a chamar de política.

Todavia, tal mutação não dissolve a existência de um projeto político-ideológico junta a sigla e que este esteja sendo construído a nível nacional. Aliás, a alienação deste processo, o desconhecimento do mesmo, auxilia em muito mais do que prejudica a construção deste, visto o fato de que os melhores obreiros para tais edificações, não são militantes instruídos, mas sim a massa de ignorantes mal informados e oportunistas.

Cito aqui, dois exemplos que bem espelham esse tipo de comportamento. O primeiro vem de uma estudante que, nos idos de 2000, militava ardentemente para um mandatário local de sua cidade que, por sua deixa, era filiado ao PSDB. Um dia perguntei-lhe o que ela pensava a respeito da governança do então Presidente da República, o senhor Fernando Henrique Cardoso. Essa me respondeu laconicamente: "ele é um incompetente". Muito bem, mas logo em seguida, lhe perguntei: bem, se ele é um incompetente, por que você fez campanha para o 45? Aí a menina se empolgou: "Porque o 45 é o melhor! Porque...", e lá foi-se a ladainha.

Não estamos aqui afirmando que dentro de uma sigla partidária não haja pessoas dignas e indignas, estamos sim chamando a atenção para o fato de que a incauta jovem era incapaz de compreender que ambos deveriam, a priori, partilhar do mesmo projeto político-ideológico, pois para ela o 45 de sua cidade não era o PSDB nacional, partido governista, pelo fato de ela ter uma percepção afetiva, personalista da sociedade, estando deveras distante de uma percepção racional-legal.

Outro caso, mais emblemático, vem-nos de um sectário do PDT, que, quando interrogado por mim sobre inúmeros pontos sobre a sua atuação política, em meio a uma e outra pergunta longo me disse que: "[...] olha professor, sabe esse negócio de partido só existe por formalidade. Ninguém mais está preocupado com a ideologia dele".

Essa face amorfa de nossa cultura política não é apenas dolosa localmente, pois é essa mentalidade política amorfa e deformada que dá sustentação para toda estrutura patrimonialista de nosso Estado e, principalmente, a implementação de projetos políticos autoritários nominados com eufemismos como "democracia popular", da mesma forma que a farinha que se mistura para dar forma aos mais deliciosos manjares ou, para os mais indigestos angus, como o nosso Estado.

Criamos monstros societais por reduzirmos a compreensão de nosso universo social a um mero trocadilho entre nossa parca percepção afetiva da realidade em um flerte com a nossa ignorância.


Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "OPINIÃO"Índice das publicações sobre "OPINIÃO"
31/12/2022 - 07h25 Pacificação nacional, o objetivo maior
30/12/2022 - 05h39 A destruição das nações
29/12/2022 - 06h35 A salvação pela mão grande do Estado?
28/12/2022 - 06h41 A guinada na privatização do Porto de Santos
27/12/2022 - 07h38 Tecnologia e o sequestro do livre arbítrio humano
26/12/2022 - 07h46 Tudo passa, mas a Nação continua, sempre...
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.