Fato 1. Em outubro de 2003 as comunidades políticas e jurídicas do país ficaram atordoadas com a declaração prestada pelo então vice-presidente do STF, ministro Nelson Jobim, à repórter Lydia Medeiros: dois artigos da Constituição Federal de 1988 haviam sido incluídos no texto sem terem ido à votação. O pedido para que isso acontecesse foi feito por Ulysses Guimarães e obteve aval do deputado federal Nelson Jobim que firmou um pacto de silêncio de quinze anos sobre o assunto. Um dos preceitos se refere à independência dos poderes de Estado. O outro ainda está sob sigilo. Fato 2. Semanas antes dessa assustadora confissão, o então presidente do STF, ministro Maurício Correa, formulara, à gestão do presidente Lula, críticas que extrapolavam, em muito, os limites constitucionais e a cortesia que devem orientar as relações entre os poderes de Estado. No dia seguinte, os jornais noticiavam que o ministro Nelson Jobim havia procurado Maurício Correa para repreendê-lo. Ao ler a matéria, pensei que o ministro colocara as competências no devido lugar, mas não foi assim. Jobim fora ao encalço de Maurício Correa para afirmar que, na sua opinião, o governo Lula ia muito bem, obrigado. Havia na corte constitucional brasileira bancada de governo e de oposição. Fato 3. Sessenta magistrados gaúchos acabam de lançar manifesto no qual conclamam o Presidente do STF a afastar a possibilidade de ser candidato à presidência da República ou a renunciar à condição de integrante do Poder Judiciário. E exigem dele que "se atenha aos limites éticos da Magistratura e às regras da Constituição". Fato 4. Em entrevista, na qual retoma as críticas ao presidente do Supremo, o presidente da Ajuris afirmou que o Poder Judiciário é um poder político, sendo naturais "as declarações políticas, de cunho institucional, proferidas por seus membros", mas são preocupantes as aspirações presidenciais de Nelson Jobim para o pleito de 2006. Diante desses quatro fatos, que se alinham em paralelo à sucessão de escândalos que chega à opinião pública envolvendo governo e parlamento, resultam surpreendentes as afirmações de que nossas instituições estão funcionando, como se houvesse mérito em funcionar mal e para o mal. Como cidadão brasileiro, peço aos poderes da República que ouçam os juízes gaúchos. E aos juízos gaúchos, peço que reflitam sobre o fato de que se o Poder Judiciário é um poder político, isso não abre qualquer fresta para a ideologização da atividade jurisdicional, como tem acontecido aqui. É exigência da democracia que quem exercite poder de Estado aberto à influência ideológica se submeta periodicamente ao voto popular para ali ser esconjurado ou abençoado pela sociedade. Alinhamento partidário ou ideológico influenciando poder de Estado de modo vitalício é totalitarismo. Nota do Editor: Percival Puggina é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.
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