Olho pela janela de meu quarto. É um dia de vento. Ao longe, uma grande mangueira balança com o vento. O barulho do vento nas folhas é impressionante, assim como a algazarra dos periquitos que disputam um naco de fruta. Subitamente a porta é pega pelo vento e o estrondo é inevitável. Desfaz-se o encanto da árvore e dos periquitos por uns instantes, abro a porta novamente e tento me refazer do susto. O episódio, bastante simplório, dá uma noção do que é a arquitetura e de como ela se relaciona com o meio ambiente. Embora o referencial seja muito pessoal, ele é humano o suficiente para ser o ponto de partida para reflexões mais extensas, já que a "arquitetura-ao-vento" é irritante e a "natureza-ao-vento" é, ao contrário, muito agradável - e não apenas neste caso. Não pretendo discorrer sobre o histórico duelo entre homem e natureza. Muito embora a arquitetura tenha se desenvolvido como um jeito blasé de encarar a natureza, penso que é mais importante perceber os pontos de encontro entre uma e outra - se é que eles existem - do que empunhar régua e esquadro como se fossem armas com as quais a natureza será domada. Esqueçam essa dialética miserável; mesmo em projetos soi disant vernaculares ou regionalistas, ela está presente. Nenhum arquiteto tem a coragem ou a humildade de não projetar, mesmo quando percebe que uma árvore é, na maioria dos casos, melhor do que uma porta - não apenas num dia de vento. A falta de coragem impede o indivíduo de experimentar; a falta de humildade impede-o de respeitar o que lhe é diferente. Em arquitetura isso pode ser visto na rudeza da divisão entre arquitetura e paisagismo - como se projetar uma casa não interferisse na paisagem, como se um jardim não pudesse ser tão útil e necessário quanto uma casa. Como resultado dessa divisão, uma arquitetura pobre, de cujas janelas o indivíduo suspira pela beleza perdida; um paisagismo mendicante, que sobrevive graças aos códigos de obras, que obrigam o arquiteto a deixar espaço livre no lote. Ao somar as duas coisas e perceber que elas se encontram com maior freqüência no universo profissional, entendo facilmente por que a arquitetura está tão longe daquilo que os diletantes idealizam.
Nota do Editor: Christian Rocha vive em Ilhabela, é arquiteto por formação, aikidoka por paixão e escritor por vocação. Seu "saite" é o Christian Rocha.
|