Você, caro(a) leitor(a), certamente já viu ou conheceu alguma “Geni” ao longo da vida. Existem muitas espalhadas por aí. Ela é apenas uma mulher, como outra qualquer. Ou um homem, como outro qualquer – mas também, dependendo da ocasião, pode ser também um partido ou instituição. Mas, via de regra, são mesmo pessoas. Pessoas comuns, que encontramos cotidianamente no nosso dia-a-dia. Sós, desprotegidas. Porém, de certa maneira, são pessoas “diferentes”, condenadas a priori pela sociedade ou pelas comunidades em que vivem. São afinal pessoas “úteis”, pois, quando a coisa fica feia, e essa mesma sociedade/comunidade, que outrora as condenava, necessita agora dos seus préstimos, dos seus serviços, elas passam a ser as melhores pessoas do mundo: inocentes úteis, digamos assim. Até que, passando aquela “emergência” e, livre do problema que a afligia ou incomodava, essa mesma comunidade, melhor dizendo, essas mesmas pessoas (sim, pois uma comunidade é composta de pessoas, embora nem sempre pensemos dessa forma) voltam a condenar aquelas “criaturas de Deus”, as “Genis” da ocasião, ao degredo e/ou à execração pública. A Geni, ou “o Geni” (pois o “Cristo” da história aí tanto pode ser homem como mulher, mas, se for mulher, tanto melhor), está em todos os lugares e épocas. Pode estar no seu bairro – sim, pode ser um vizinho seu, aí pertinho de você. Pode ser aquele sujeito “diferente”, “estranho”, “feioso”, “com cara de maluco” e “que se veste mal pacas”. Ou aquela mulher “esquisita”, “que parece que não trabalha, fica o dia todo em casa ou flanando por aí”, ou que “sei não, recebe muitos homens em casa e, o que é pior, anda pelos botecos”. Pode ser “um mendigo, um traste qualquer”, “um preto”, “um(a) bicha”, “uma puta”, “um baiano”, “um paraíba”, “um japa”, “um judeu” – se vacilar, pode ser enfim qualquer um. Pode ser, até mesmo, eu ou você. Mas eis que pinta uma pequena tragédia, daquelas que, vez em quando, visitam nossas vidas e trazem-nos o nosso quinhão de infortúnio. Veja bem, logo nós, que estávamos tão acostumados com uma vida tranqüila e até mesmo pontuada por algumas alegrias, no máximo uma tristeza aqui, outra ali – quando não embalados por uma certa monotonia e pela rotina. E não é que a Geni, nessa hora, vem em nosso socorro e serve-nos como uma espécie de “tábua de salvação”!? Mas, não tenha dúvida que, passado o sufoco, e passado algum tempo, a Geni deixará de incorporar o papel da “heroína” e voltará a ser a “pobre coitada”, a desgraçada de sempre, e aí voltaremos a jogar nela as nossas pedras, a nossa intolerância. Ou, se não exatamente nessa Geni, arrumamos uma outra, alvo de nossas pedras, alívio de nossas culpas e pecados. A Geni da vez, ao que parece, é o PT. Portanto, é hora de jogar pedra nele(a). “Joga pedra na Geni! Joga bosta na Geni!”. O PT utilizou-se de caixa 2. “Joga pedra na Geni, digo, no PT!”. Alguns dirigentes, políticos ou militantes do PT envolveram-se em negócios escusos? Um foi pego, de modo vexatório, canhestro, com dólares na cueca? Outro "ganhou" uma Land Rover de um empresário, e um outro mais foi pego achacando um "honesto empresário do ramo de loterias e caça-níqueis”? “Joga pedra no PT! Joga bosta no PT! Maldito PT!” Pouco importa o trabalho de politização e as lutas pelos direitos do cidadão implementados e estimulados pelo PT na sociedade brasileira ao longo de tantos anos. Pouco importa o trabalho dos sindicatos, das comunidades eclesiais de base e dos movimentos sociais – em sua maioria ligados a esse partido. Pouco importa que o PT mudou a cara da política brasileira nesses últimos vinte e poucos anos – e para melhor. Pouco importa. Mas por que isso haveria de importar – não é mesmo? Agora, todos na multidão, todos os “homens e mulheres de bem”, um a um, começam a gritar, e a lembrar uns aos outros e aos outros todos num ajuntamento de juízes, todos os “crimes” e “pecados” da Geni, digo, do PT. Mas talvez o que eles desejam é apenas, de um modo irracional, extravasar a sua ira e purgar seus próprios pecados. Não importando, a essa altura do linchamento, se esses “crimes” e “pecados” da “Geni” são verdadeiros ou não. Quais são verdadeiros e quais, não. Tampouco interessa aquilatar, além da veracidade de alguns desses “crimes” e “pecados”, a sua gravidade ou originalidade. O que importa é que a multidão, a turba ignara, precisa de um motivo que legitime sua fúria insana, sua sede de vingança contra a pobre Geni que se insinuava tão diferente e agora se revela tão “ordinária”, tão comum aos olhos de muitos. Não importando se seus pecados também são nossos pecados. Se se está diante de uma pecadora (ou de um pecador), um(a) “semelhante” a todos aqueles que atiram pedras. O que importa é atirar pedras. “Joga pedra na Geni! Joga bosta na Geni!” Serão todas as pedras devidas? Serão puros e justos os que agora atiram pedras? O PT é responsável pela morte de Celso Daniel! O PT é responsável também pela morte de “Toninho do PT”! – ex-prefeito da cidade de Campinas, que foi assassinado. O PT é um partido de mafiosos e corruptos! O PT é responsável pela morte do jovem Jean no metrô de Londres! O PT é responsável pela corrupção nos Correios! – e na CEF também, e no IRB, e em todos os órgãos da União, nos governos dos Estados e prefeituras de todas as cidades. O PT é responsável por ter eleito um presidente da República nordestino, “monoglota”, cheio de irmãos pobres, sem berço, sem curso superior e, como uma decorrência disso tudo, desses inúmeros “defeitos”, despreparado. Só podia mesmo dar no que deu! O PT inventou o caixa 2 para financiamento de campanhas! O PT é responsável pela foco (talvez fosse mais apropriado, ou honesto, dizer surto) de febre aftosa no MS! O PT é responsável pela gripe do frango! O PT é responsável pela seca na Amazônia, no Sul e no Nordeste (ou, a depender da sazonalidade, onde quer que ela esteja ocorrendo) – e pela enchente em SP (se estiver, por acaso?, chovendo em São Paulo)! O PT é responsável pela dívida externa (e pela interna), pelo descalabro na saúde, na educação e na segurança pública em nosso país! Pelo referendo – pela vitória do “não”, ou do "sim" (se este último porventura tivesse ganho)! O PT quer implantar um modelo “chavista” no Brasil (como se Hugo Chávez fosse um demônio)! O PT aparelhou o Estado brasileiro! O PT é Bolchevique! O PT é Menchevique! É Stalinista! É Trotskista! O PT é o diabo! O PT transformou o Parlamento brasileiro numa prostituta ao instituir o expediente do “mensalão”! O PT é (ir)responsável em sua culpa, sua máxima culpa. E se, por acaso, eventualmente, se nem todas essas culpas, se nem todos esses crimes são devidos ao PT, nem que seja ao menos um deles, não importa. Não importa o seu passado, não importa a sua história. Não importa nada. “Joga pedra no PT! Joga bosta no PT! Ele foi feito pra apanhar. Ele é bom de cuspir. Ele dá pra qualquer um. Maldito PT!”
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