Depois da vitória do NÃO o que teremos? Medidas legais da parte do governo em prol da Segurança através de propostas de "fundos de segurança" ou coisas do gênero com, é claro, o ônus recaindo sobre nós, como resposta tardia e envergonhada desse governo? Ofensiva geral e irrestrita do MST contra fazendeiros? Muito de tudo isso, sem dúvida. Pois o governo não só pensa em fechar os olhos aos cangaceiros do MST, estimulando a "martirização" de alguns deles, como é bem capaz de pôr a culpa de todas as mortes por arma de fogo na população que resistiu ao seu referendo, desde já chamada "traidora da pátria". Se essas são perspectivas fáceis de antever, outra, no entanto, não é. Refiro-me ao fortalecimento do instrumento do plebiscito e do referendo como arma de empobrecimento da democracia representativa, onde graves questões serão decididas pelo "sábio" povo obrigado a dizer sim ou não a questões que não alcança e que não podem ser reduzidas a duas opções. A vitória do NÃO, uma derrota para esse governo, poderá paradoxalmente fortalecer esse instrumento favorito de todo socialista quando nele vislumbra a chance de desmoralizar um Parlamento que não consegue comprar inteiramente. Para isso somente alguns ajustes serão necessários. Como escrevi em artigo anterior, a democracia plebiscitária é a glória de todo totalitário que se julga forte o suficiente para submeter seu povo ao teste supremo da obediência canina - e que, garantido da certeza de que quanto mais seu povo é levado a interpretar essa especiosa liberdade de escolher entre coisas que não são do seu interesse nem de sua vontade, como demonstração de madura democracia, mais esse povo estará perto do fim de todos os seus direitos. Pois os "democratas" do orçamento participativo, da democracia direta, da democracia à suíça, partidários confessos do SIM ou do NÃO, ativaram a campanha eleitoral do desarmamento alimentados e colimados por essa ótica canhestra. No caso do referendo atual, tendem a ver sua derrota para o Não como uma expressão vitoriosa do "fascismo" ainda existente, e o SIM como uma fraqueza do governo ainda não pronto para erradicar totalmente as elites. Esse governo que perdeu o referendo certamente não é o governo dos seus sonhos. Isso só acontece pelo efeito perverso da escolha maniqueísta de qualquer plebiscito ou referendo agindo sobre uma plataforma coletivizante e estatizante. Cinde-se com eles o país em dois lados, necessariamente os do Bem e os do Mal. Questões gravíssimas que nunca puderam ser resolvidas em qualquer país avançado politicamente, no país plebiscitário são resolvidas pelo apelo dramático, desesperado, que ganha contornos radicais ao produzir consensos enganosamente altos e que tendem ao equilíbrio neutralizante. O Mal e o Bem se aproximam do 50%. Ora, isso não é desejável nem tolerável em países onde prevalecem a sublimação e a diluição dos antagonismos mais fortes e destruidores em arrefecidas opiniões. Ao Mal, seja ele qual for, não se pode conceder jamais a metade do consenso social. Prognostico que as mais pesadas retaliações ainda estão por vir para quem tem uma arma. Uma morte acidental de uma criança poderá incriminar toda a família e possivelmente a vizinhança. Redes de espiões informarão ao Estado a localização de armas, registradas ou não. Muita legislação complementar haverá de ser feita quando os holofotes estiverem focando outro escândalo. Preparam-se! Vem aí a vingança governista contra aqueles que possuem uma arma através de truques como o aumento de penas para homicídios dolosos ou culposos, ou para crimes com lesões corporais de médias a graves; taxas impagáveis, senão pelas elites; testes e licenças indecorosas; imputação de crime hediondo contra o Estado de Direito, contra a Democracia, tais serão as desculpas a justificar essa vendeta a mais! O atual Estatuto do Desarmamento ainda carece de regulamentações. Estará aí a porta de entrada do Anjo Vingador do Estado, não um Estado comum, mas um Estado Policial, dos mais loucos sonhos totalitários. Mas o povo percebendo como foi enganado e porque foi instado a decidir pelo Sim ou pelo NÃO, descobrirá finalmente o instrumento totalitário do Estatuto do Desarmamento, construído à socapa por parlamentares aprendizes de feiticeiro. Nota do Editor: Carlos Alberto Reis Lima é médico e formado em História e Ciência Política na UFRGS em nível de Mestrado.
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