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Opinião
08/11/2005 - 18h17
Mentalidade criminosa
Olavo de Carvalho - Parlata
 

A estratégia de defesa adotada pela Presidência da República para esconjurar suspeitas por atacado e reprimir nas consciências o direito mesmo de suspeitar é o mais eloqüente sinal não somente das culpas que carrega, mas também de sua total falta de disposição de submeter-se à ordem legal que lhe incumbe representar e defender.

Nenhum dos presidentes anteriores, acusado do que quer que fosse, teve jamais o desplante, o cinismo supremo de negar à mídia o direito de publicar indícios, de pedir investigações, de destampar impiedosamente quantos ralos e latrinas fosse necessário. Só mesmo o governo chefiado por um semi-analfabeto pode exigir "provas" de uma denúncia de imprensa e ameaçar criminalizá-la por falta delas. Esse homem que se gaba de nunca ter lido um livro só mostra, com essa atitude, que não sabe nem ler jornal; mas seus assessores espertos, que o sabem perfeitamente, prevalecem-se da ignorância presidencial para se fazer eles próprios de ignorantes e impingir à opinião pública critérios de julgamento que nenhum cidadão letrado pode aceitar. Isso é, em sua forma mais pura e evidente, exploração da boa-fé popular. "Provar" a veracidade de uma declaração está infinitamente acima da capacidade e dos deveres do jornalismo.

Tudo o que o jornalista pode fazer é mostrar a fonte do que disse e demonstrar que reproduziu suas palavras o mais fielmente possível. Veracidade ou inveracidade do conteúdo dependem da fonte e somente dela. E só a Justiça pode confirmar ou negar uma ou a outra. Ao jornalista não cabe antecipar-se à Justiça, provando tudo logo na primeira denúncia, mas apenas levantar indícios razoáveis, sob a forma de documentos ou testemunhos - exatamente com fez Veja no concernente à ajuda ilegal de Cuba à candidatura Lula -, para justificar a investigação judicial que, esta sim, dirá se a acusação era verdadeira ou falsa.

Mesmo num processo judicial não se exige que a parte denunciante forneça provas cabais desde o início. Elas são oferecidas no curso do processo, que se chama "processo" justamente por isso e por nada mais. Se fosse preciso provar tudo de cara, não haveria processo nenhum. O processo é o processo da descoberta progressiva da verdade. Dos primeiranistas de faculdade aos juízes do STF não há em todo o universo judicial brasileiro quem ignore isso. O único que o ignora está no Palácio do Planalto: é o sr. Luiz Inácio Lula da Silva.

O povo brasileiro precisaria ser tão ignorante quanto ele - ou ser reduzido artificialmente a essa ignorância por uma feroz campanha de desinformação - para aceitar a idéia de que o jornalista, se não pode provar desde logo e por seus próprios recursos a veracidade de declarações colhidas de uma fonte, é um criminoso. Criminosos são os assessores presidenciais que querem enganar a opinião pública, levando-a a acreditar que esgares ameaçadores são justiça, quando são apenas a justiça da Rainha de Copas.

Criminoso não é denunciar sem provas cabais: criminoso é exigir provas cabais no início para impedir que elas sejam obtidas no fim. Tanto mais intolerável é esse procedimento porque vem justamente de indivíduos e grupos que, tendo promovido a cassação do ex-presidente Fernando Collor às pressas, sem esperar por provas judiciais de qualquer natureza, não tiveram sequer a honestidade mínima de retratar-se de seus discursos de acusação quando a própria Justiça, anos depois, sentenciou que essas provas simplesmente não existiam. Se esses mesmos, agora, numa inversão kafkiana da lógica judicial, requerem provas não somente como exigências prévias para a investigação que deveria buscá-las, mas como condições legitimadoras do direito mesmo de pedir uma investigação, revelam com isso o quanto é arraigada e natural, nos seus corações, a crença de que deve haver uma lei dura e exigente para seus inimigos e outra, branda e generosa, para eles próprios. Só que essa crença é o traço mais básico e inconfundível da mentalidade criminosa.


Nota do Editor: Olavo de Carvalho é jornalista e filósofo nascido em Campinas, Estado de São Paulo, em 29 de abril de 1947. Tem sido saudado pela crítica como um dos mais originais e audaciosos pensadores brasileiros. Professor de filosofia e diretor do Seminário de Filosofia do Centro Universitário da Cidade (RJ). Autor das obras "O Jardim das Aflições" e "O Imbecil Coletivo: Atualidades Inculturais Brasileiras". Editor do site Mídia Sem Máscara.

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