Terminou na última sexta-feira a novela "América", que colocou no centro das discussões o problema de inserção dos Portadores de Necessidades Especiais, em particular, o dos deficientes visuais. Apesar da importância do tema, pouco se falou do avanço da tecnologia para prevenir algumas doenças que podem levar à cegueira. A primeira causa de cegueira irreversível é o glaucoma, uma doença assintomática que, lentamente, provoca lesão do nervo óptico e da camada de fibras nervosas da retina. Segundo a Associação Brasileira dos Portadores de Glaucoma (Abrag), cerca 900 mil brasileiros sofrem de glaucoma, porém, mais da metade não sabe que sofre da doença. Quando o paciente percebe que o campo de visão foi afetado, 30% a 40% das fibras nervosas já foram destruídas. "Hoje, graças ao avanço da tecnologia, o glaucoma já pode ser diagnosticado precocemente e tratado antes que um número grande de fibras nervosas seja perdido. Em última análise, ao diagnosticar e tratar o glaucoma precocemente, evitamos a progressão para a cegueira", afirma o Dr Vital Paulino, diretor do Setor de Glaucoma da Unicamp e professor livre docente da Faculdade de Medicina da USP, que já utiliza em seus pacientes o Stratus OCT (Tomógrafo de Coerência Óptica), um dos equipamentos que mapeia e monitora as alterações na espessura da camada de fibras nervosas da retina. Segundo Paulino, especialista em glaucoma, pessoas com mais de 45 anos, portadores de miopia, afrodescendentes, com histórico familiar de glaucoma ou que foram vitimados por lesões oculares têm mais chances de desenvolver a doença. Os pacientes que fazem parte de algum destes grupos de risco devem receber acompanhamento mais detalhado". As conseqüências do glaucoma, quando não tratado a tempo, é a perda do campo de visão, seguida da perda da visão central, ocasionando a chamada visão tubular. O tipo mais comum de glaucoma, chamado de crônico simples, só pode ser diagnosticado por meio de exame oftalmológico. Já o glaucoma agudo, pode ser detectado quando há aumento repentino da pressão ocular (acima de 21 mmHg) e provoca dor e perturbação da visão. Para a maioria dos pacientes, o tratamento do glaucoma é clínico (aplicação de colírios baixam a pressão ocular). Para os casos que não respondem ao medicamento, o tratamento é cirúrgico. Outra doença que pode levar à cegueira é a Degeneração Macular Relacionada à Idade, comumente chamada DMRI. Ela afeta a mácula, a região central da retina - membrana responsável pela percepção das imagens no fundo do olho -, causando importante prejuízo na visão central, aquela necessária para reconhecer um rosto, ler ou dirigir um carro. Desde o século passado, com o aumento da expectativa de vida de uma população mundial que envelhecia cada vez mais nos países desenvolvidos, a DMRI é reconhecida como a maior causa de cegueira acima dos 50 anos de idade. A doença se apresenta em duas formas clínicas: a forma seca e a exsudativa. "Apesar de a forma seca ser a mais comum, geralmente ela é pouco sintomática. O grande prejuízo visual geralmente vem das formas exsudativas, onde há a ocorrência anormal de vasos mal formados sob a retina. Estes vasos podem sangrar e causar grande prejuízo visual, muitas vezes irreversível e incapacitante" explica o especialista em retina, Dr Laurentino Biccas, professor da Escola de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de Vitória e diretor da Clínica Ocular Oftalmologia. Os sintomas iniciais são alterações na visão central, com a percepção de manchas e de distorção das imagens, comprometendo atividades cotidianas como a capacidade de leitura e a perda de visão de detalhes. A visão periférica não é habitualmente comprometida pela doença. "Este é um problema de saúde pública. A doença precisa ser diagnosticada precocemente e acompanhada de perto, pois hoje dispomos de tecnologia capaz de impedir com eficiência a progressão desta condição devastadora, mas ainda não conseguimos recuperar habitualmente o que foi perdido na visão central", afirma Biccas. No Brasil, estima-se em mais de 5 milhões o número de afetados pela degeneração macular. Nos EUA, número de pessoas com DMRI Intermediária supera em muito o de portadores glaucoma ou de retinopatia diabética. O glaucoma atinge 4,4 milhões de pessoas, a retinopatia diabética atinge 5,3 milhões e a DMRI intermediária alcança 8 milhões. Desse total, entre 15% e 18% de pacientes evoluirão para a DMRI avançada em 5 anos. Vale lembrar que, entre nos, a deficiência visual foi a principal referida no último Censo de 2000, reclamada por 10% dos entrevistados. O impacto da DMRI sobre a qualidade de vida da população é devastador: quando medidas antropométricas específicas são empregadas, a doença é mais debilitante do que outros problemas crônico-degenerativos como artrite, DPOC e AIDS . Muitos trabalhos científicos têm sido realizados nesta área com a finalidade de prevenir a DMRI. "Centenas de milhões de dólares foram gastos em estudos e a pesquisa continua. No campo da prevenção, o mais completo deles foi feito nos Estados Unidos entre 1991 e 2001, pelo National Institutes of Health e chamou-se AREDS (Age-Related Eye Disease Study). Este estudo envolveu quase 5 mil pacientes e comprovou o efeito de uma formulação específica de antioxidantes e do zinco na prevenção da progressão de formas graves da DMRI", afirma o especialista. Dicas - Leve uma vida saudável. Consumir folhas verde-escuras e frutas como o kiwi e evitar o fumo ajudam a prevenir a DMRI; - Embora polêmico, o uso de óculos escuros de boa qualidade em ambientes externos pode prevenir ou retardar a doença; Ele observa que, na maioria das vezes, o exame oftalmológico já é suficiente para diagnosticar a doença, mas indica outros exames tradicionais importantes na detecção, especialmente para quem tem histórico familiar da doença: - Mapeamento de retina com a pupila dilatada. Permite enxergar a retina de forma panorâmica; - Retinografia fluorescente (ou angiofluoresceinografia). Estudo fotográfico contrastado da retina com fluoresceína injetada na veia, útil para observar detalhes característicos desta doença; - Auto-exame com Tela de Amsler: o próprio paciente dá o alerta quando percebe alterações na sua visão central ao observar periodicamente um cartão quadriculado específico. "Mudamos radicalmente a forma de diagnosticar e de tratar os pacientes com a doença. Com a tomografia de coerência óptica, Stratus OCT, conseguimos "ver" as camadas que estão abaixo da superfície da retina, permitindo o diagnóstico precoce não apenas da DMRI como do glaucoma e outras doenças da retina. No tratamento, a terapia fotodinâmica foi também um grande avanço", finaliza Laurentino Biccas.
|