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Opinião
26/11/2005 - 13h01
O estigma da concentração de renda
João Luiz Mauad - MSM
 

A principal crítica ao capitalismo é a de que ele é concentrador de renda. Não raro deparamo-nos com as mais diversas pesquisas e dados estatísticos dando conta de que a maior parte das riquezas do planeta estão concentradas nas mãos de poucos. A ONU, por exemplo, tem divulgado números que apontam para uma relação 80 x 20, ou seja, que 80% do PIB mundial pertenceriam aos 20% mais ricos e vice-versa.

(Não acredito nesses números, até porque existem pesquisas feitas por entidades privadas sérias que apontam para resultados diferentes. Mas não é disso que pretendo ocupar-me nesse texto. Ao contrário, para efeito de raciocínio partirei da premissa de que esses dados são confiáveis e corretos.)

O que quase ninguém pergunta é qual seria essa relação antes do advento da Revolução Industrial e do capitalismo ocidental. Quais eram os níveis de concentração de renda nos períodos feudal e mercantilista? Por acaso a distribuição da riqueza era mais igualitária naqueles tempos? Decerto, não há como responder com precisão a tais questões, pois esse tipo de investigação estatística é muito recente. Entretanto, uma rápida olhada nos livros de história da humanidade nos levaria a concluir que as diferenças eram ainda maiores antes do capitalismo.

Durante a Idade Média, período do feudalismo, havia, basicamente, três classes de gente. Em primeiro plano estavam os nobres, uns poucos privilegiados que, em razão de herança familiar e sem que tivessem que produzir qualquer coisa, ostentavam uma riqueza nababesca para os padrões da época, obtida pela exploração (espoliação) da vassalagem a eles subordinada por juramento de fé e submissão. Os vassalos eram a imensa maioria, trabalhavam de sol a sol, em condições extremamente insalubres e ficavam com uma parte mínima de tudo que produziam, suficiente apenas para a subsistência. Havia ainda uns poucos comerciantes e artesãos, sem qualquer representatividade sócio-econômica num sistema eminentemente agrário.

Com o mercantilismo nasceu uma nova classe - a burguesia - originária da expansão do comércio entre as cidades. No entanto, as condições de vida da grande maioria da população não mudou muito. Continuaram vivendo em condições precárias e miseráveis, sujeitas a todo tipo de privação. A concentração de riqueza era talvez ainda maior que no período feudal, com a agravante de que a acumulação mercantilista, predominantemente centrada no entesouramento de ouro e outros metais preciosos, não impulsionava a geração de novas riquezas, em contraste com o que ocorre no capitalismo.

Este é, aliás, um outro aspecto importante, que os anti-capitalistas não levam em conta quando falam da famigerada concentração de renda. A acumulação de capital no capitalismo, diferentemente do que ocorria no mercantilismo, impulsiona novos investimentos, que, por sua vez, vão gerar novas riquezas, novos postos de trabalho e novas oportunidades, num verdadeiro moto contínuo e virtuoso em direção ao progresso. Foi essa capacidade de multiplicar a riqueza, intrínseca ao capitalismo, que possibilitou o incremento das condições de vida de toda a população à partir da Revolução Industrial, notadamente dos mais pobres, cujos padrões de longevidade, saúde, conforto e bem-estar geral são hoje infinitamente superiores aos dos seus antepassados, ainda que aquinhoados com somente 20% (ou seja lá que número for) da renda total.

É inegável que o desenvolvimento da indústria do vestuário, a mecanização da produção e a melhoria do processamento e distribuição de alimentos têm, por sua própria natureza, beneficiado um público cada vez mais amplo. Além disso, saneamento, transportes, moradia, saúde, comunicações, entretenimento, enfim toda uma gama de benefícios até pouco tempo impensáveis mesmo para os mais abastados, são hoje uma realidade acessível a muitos.

Nos dias atuais, inclusive em países do terceiro mundo como o nosso, boa parte da população dentro da faixa dos 80% mais pobres possui televisão, aparelho de som, telefone celular, dorme em colchões de espuma, veste jeans, usa tênis coloridos, se diverte nos cinemas, shoppings e lanchonetes. Tudo em função do desenvolvimento acelerado desencadeado pelo advento do capitalismo.

O outro aspecto, recorrentemente desconsiderado pelos críticos da disparidade de rendimentos, está ligado à natureza desigual dos homens e foi resumido brilhantemente por David Hume, cerca de 250 anos atrás. O pensador britânico inferiu que, caso se dividisse toda a riqueza do mundo entre os seus habitantes, os diferentes graus de habilidade, atenção e diligência dos homens iriam imediatamente romper essa igualdade. E caso se refreassem essas virtudes, a sociedade se rebaixaria à mais extrema indigência e, em vez de impedir a miséria e a mendicância de uns poucos, torná-las-ia inevitáveis para toda a sociedade. (Notem que ele disse isso muito antes do fracasso de todas as experiências comunistas do Século XX).

De fato, quem não gostaria de possuir os dotes artísticos do arquiteto Oscar Niemeyer, do compositor Chico Buarque ou da atriz Fernanda Montenegro? Quem não almejaria poder desfrutar dos elevadíssimos níveis de bem estar, conforto e segurança que o talento deles pode comprar? Qual o garoto que não gostaria de ter a habilidade de um Ronaldinho Gaúcho? Que menina não gostaria de ter nascido bela e esbelta como a Gisele Buntchen? Que empresário não gostaria de ter criado a Microsoft? No entanto, como bem lembrou o mestre Roberto Campos, Deus não é socialista, ou não nos teria criado tão diferentes uns dos outros. Eu, particularmente, acredito que Ele deve ter lá as suas razões...

Portanto, a sugestão que costumo fazer àqueles que colocam o debate honesto acima do sofisma ideológico, é que deixem de lado essas pesquisas destinadas a medir a concentração de renda, cujos resultados servem apenas para manter viva uma anacrônica luta de classes, e façam convergir o foco para a medição dos níveis efetivos de pobreza, os quais, sem a menor sombra de dúvida, têm caído de forma firme e consistente ao longo da era capitalista. Afinal, a menos que coloquemos a inveja num plano superior ao da verdade e da eficiência, o importante não é combater desigualdades, mas a pobreza.


Nota do Editor: João Luiz Mauad é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.

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