A situação social no Brasil é tão grave, o grau de miséria e de abandono de parcela considerável de brasileiros é tão absurdo e acentuado, após anos (diríamos, séculos) de omissão por parte de vários regimes e governos, que a população chega a cometer uma grave injustiça com milhares de instituições e de pessoas abnegadas, que sem alarde e nenhuma publicidade, prestam, espontaneamente, assistência material, educacional, moral e religiosa a milhões de carentes. Embora não se possa atribuir "somente" a esse estado de acentuada pobreza, de número crescente de excluídos, o visível e vertiginoso crescimento da violência e da criminalidade ao nosso redor, não há como negar que esse fator tem enorme peso nessa evolução. Um dos problemas básicos no País é a falta de educação (não confundir com a mera instrução). Outro é a inaptidão para um trabalho, que não seja o meramente braçal, cada vez mais escasso e menos remunerado, de imensos contingentes de deserdados da sorte. O que essas pessoas desassistidas e desinformadas mais precisam é de uma perspectiva, de um horizonte, de um objetivo de vida que não se limite à mera luta pela sobrevivência. Na atual condição, são como se fossem objetos descartáveis ou animais irracionais, usados e explorados impunemente, numa forma disfarçada e perversa de escravidão. O cientista político francês Charles Renouvier, um dos expoentes do liberalismo no século XIX, já constatava que "o bom cidadão deve reconhecer a pessoa do outro lado como sua igual por natureza e em dignidade - com um fim em si - e, conseqüentemente, jamais utilizá-la como um simples meio para alcançar seus próprios fins". Irritam-me, profundamente, as generalizações que, como acentuou o controvertido jornalista e escritor carioca Nelson Rodrigues, "são sempre burras". E estas têm sido cada vez mais freqüentes, sobretudo por parte de alguns órgãos de imprensa e de pessoas razoavelmente informadas, mas que não pensam ou não analisam o que dizem. Afirmar, por exemplo, que "todos" os políticos são corruptos, ou oportunistas, ou desonestos, é um perigoso e estúpido desserviço que se presta à verdade e, sobretudo, à sociedade. Ouço, a todo o momento, outro tipo, até mais comum, de generalização. O de que as pessoas bem instruídas, ou com altas rendas, que lhes permitem uma excelente qualidade de vida, são "todas" egoístas e carecem do mínimo senso de solidariedade social. Isto, todavia, não é verdade. Há, de fato, gente assim, é inegável. Conheço, porém, (e certamente o leitor também), dezenas e dezenas de indivíduos bem sucedidos, que poderiam gozar tranqüilamente da riqueza de que dispõem, se desdobrando na realização de um trabalho voluntário, na maior parte das vezes anônimo, para manter creches, orfanatos, asilos, hospitais e tantas outras instituições, voltadas à filantropia e à benemerência. O que eles precisam não é sequer de reconhecimento (que a maioria dispensa), mas de ajuda, de adesão e de colaboração, por mínima que seja, de uma imensa massa de omissos, que vive "namorando o próprio umbigo" e se limita a criticar aqueles que agem. Qualquer generalização, nesse caso, é puro preconceito. Ou pior... "Como, se o País tem tanta gente vegetando na mais absoluta miséria?!", certamente perguntarão os cépticos e acomodados, sempre dispostos a criticar, mas que se omitem na hora de agir, em tom de afirmação. É fato que, por mais que esteja sendo feito, é pouco, pouquíssimo, absolutamente insuficiente para atender a todos os que necessitam. Imaginem, então, o caos que se instalaria na sociedade caso não existissem essas pessoas e instituições! Seria uma catástrofe!! Há que se denunciar, sempre, com a máxima veemência, as atitudes condenáveis, corruptas e cínicas, que prejudicam a população, exigindo a punição de quem age assim. Mas sempre "dando nome aos bois", sem a estupidez das generalizações. Contudo, é indispensável, também, que aquilo que se faz para, pelo menos, minorar o caos social no País, seja igualmente enfatizado. Essas informações, além de representarem atos bom senso e de justiça com os que se preocupam com os sofrimentos alheios, têm um papel altamente educativo. E, como constatou o escritor H. G. Wells, em um dos seus textos: "A história humana é mais uma competição entre a educação e a catástrofe". Eduquemos bem para evitarmos ocorrências catastróficas. Nota do Editor: Pedro J. Bondaczuk é jornalista e escritor.
|