Quem surfa sabe que há um momento e um modo certo de pegar a onda. Antecipar-se a esse momento ou errar o modo significa receber a onda por cima. Retardar-se faz com que o surfista avance um pouco, mas perca o ponto de deslocamento mais veloz e mais longo. O presidente Lula e seu partido, ao longo dos anos em que caminharam na direção do Palácio do Planalto, defendiam idéias sobre a economia nacional que consistiam em "furar a onda", ou seja, ir contra as energias da economia mundial, seguir na contramão de tudo o que dava certo, como integração de mercados, desestatização e desregulamentação. A tudo isso, aliás, o PT e seu principal líder chamavam de neoliberalismo e respondiam com alternativas estatizantes e socialistas. Quem tenha assistido a entrevista do presidente Lula ao programa Roda Viva pôde perceber o orgulho com que ele se referia aos índices de crescimento da economia, utilizando tais dados como saldo positivo a ser contraposto ao pesado déficit político acumulado. De fato, na esfera econômica, o governo petista não se meteu a furar a onda. Percebeu que o jogo certo é outro e tem evitado que ela rebente no próprio lombo. Ótimo. Mas está longe de ser um surfista competente. O Brasil do presidente Lula, na verdade, perdeu o tempo e o modo certos e, como acontece nesses casos, avançou sim, mas bem menos do que poderia. Cresce abaixo da própria média mundial e muito aquém da maior parte de nossos vizinhos sul-americanos. Mas se a economia vai andando assim, a reboque da onda, numa espécie de "jacaré" mal feito, a política é de cobras e lagartos. Nunca a verdade foi tão maltratada. O presidente posou perante seus entrevistadores como intransigente defensor do trabalho das CPIs instaladas no Congresso Nacional, esquecido de que bloqueou a CPI do Waldomiro Diniz e de que, até jogar finalmente a toalha, quis impedir qualquer investigação parlamentar sobre a torrente de denúncias que abalou seu governo. Não haveria pão-de-ló nem cafuné para quem as subscrevesse. Flagelou-se publicamente o senador Suplicy que tacou o jamegão no documento. Mandaram-se ministros ao plenário para pressionar. Liberaram-se emendas parlamentares e realizou-se a escandalosa proeza de conseguir que dezenas de deputados retirassem suas adesões ao pedido. Lideranças petistas falam em "denuncismo vazio", sustentam que "nada foi provado" e afirmam que nunca se combateu tanto a corrupção como agora. Pois é. Se nada foi provado, então Brasília foi acometida de um surto psicótico depressivo que se manifesta em injustificadas renúncias, demissões e banimentos que começaram no partido do presidente e se estenderam pela base de apoio. Denuncismo vazio e combate à corrupção? Ora, nem o lacerdismo foi tão fértil em denúncias quanto o petismo. E o que fez o PT, no governo, com o arsenal legislativo hoje disponível e com todos os instrumentos de que dispõe para apurar o que tão escancaradamente denunciava? O governo tem, para isso, mais de três mil auditores altamente qualificados na Controladoria Geral da União, o aparato técnico e funcional da Polícia Federal, a Receita Federal, a ABIN, o intercâmbio com o TCU e o Ministério Público Federal, e o comando partidário de todos os organismos sobre cujos antigos dirigentes incidiam suas acusações. Fez o quê? Nada. Uma de duas coisas é que resulta totalmente vazia: ou o denuncismo dos tempos de oposição ou o combate à corrupção que hoje tanto apregoa. Nota do Editor: Percival Puggina é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.
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