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Opinião
24/12/2005 - 12h20
Para meu pai
João Luiz Mauad - MSM
 

Qualquer um que se atreva a defender os princípios da liberal democracia ou do capitalismo de mercado nesta nossa sociedade, virtualmente arrebatada pela Revolução Cultural Gramsciana, onde o discurso prevalece sobre as atitudes e as versões têm peso maior do que os fatos, é imediatamente taxado de egoísta, ganancioso, sem coração e outras alcunhas não menos ofensivas. As pechas sobre mim lançadas, carrego-as até com certa tranqüilidade, principalmente porque acredito naquilo que defendo. Ademais, não ganho absolutamente nada com essa, digamos, "ideologia política", exceto, é claro, a satisfação do dever cumprido. Procuro manter, até onde a minha paciência frente à burrice permite, uma atitude tolerante com as opiniões contrárias, jamais levando eventuais diferenças para o lado pessoal.

Algumas críticas - talvez o mais correto fosse dizer censura -, no entanto, ainda machucam um pouco. Não pelo teor das mesmas, já que os argumentos não fogem muito do habitual e praticamente já os conheço todos, mas porque partem de pessoas que me são caras; de gente cujas opiniões considero importantes; enfim, de gente como o meu pai. É a ele que dirijo estas linhas, na esperança de que possa entender um pouco melhor o meu pensamento e, quem sabe, perdoar-me por combater, dentre outras coisas, a sedutora sereia marxista que lhe tem enfeitiçado por muito tempo, através da famigerada Teologia da Libertação.

Primeiro, porém, é preciso prestar devidas reverências à genialidade do inigualável e imortal Bastiat, de quem tomei emprestadas muitas das idéias, conceitos e passagens aqui expostas.

Antes de mais nada, é necessário dizer que, malgrado não façamos uso dessas palavras rotineiramente, nós liberais também saudamos com emoção as virtudes da caridade, da solidariedade e da justiça. Conseqüentemente, desejamos ver os indivíduos, as famílias e as nações associarem-se e cada vez mais ajudarem-se mutuamente. Comovem-nos, tanto quanto a qualquer mortal de bom coração, os relatos de ações generosas e a sublime abnegação de algumas belas almas em prol dos mais necessitados.

Além disso, a maioria de nós quer muito acreditar nas boas intenções desses intelectuais e políticos da esquerda, que pretendem extinguir dos corações humanos o sentimento de interesse, que se mostram tão impiedosos com aqueles que apelam ao individualismo e cujas bocas se enchem incessantemente das palavras abnegação, sacrifício, solidariedade e fraternidade. Queremos sinceramente admitir que eles obedecem exclusivamente a essas sublimes causas que aconselham aos outros; que eles dão exemplos tão bem quanto conselhos; que colocam as suas próprias condutas em harmonia com as doutrinas que defendem; queremos muito crer que suas palavras são plenas de desinteresse e isentas de hipocrisia, arrogância, inveja, mentira ou maldade.

Sim, pois cada um desses senhores tem um plano para realizar a felicidade humana, sempre apoiados na máxima de que é possível construir e planificar estruturas e relações sociais até alcançar o ideal da sociedade perfeita, da solidariedade, da caridade e da justiça social, ainda que para isso seja necessário o uso dos meios mais obscenos. Por conta desses ideais supostamente altruístas, se dão o direito de acusar aqueles que os combatem de egoístas, mesquinhos, interesseiros, etc. Essa, porém, é uma acusação injusta, pois se nos fosse demonstrado que é viável fazer descer para sempre a felicidade sobre a terra, através de uma organização social fictícia ou simplesmente decretando-se a fraternidade entre os homens, nós os acompanharíamos com imenso prazer.

Se os contestamos, entretanto, é porque temos suas idéias por falsas e seus projetos por tão pueris como desastrosos. Nunca nos foi demonstrado que a caridade se possa impor, pois onde quer que ela se manifeste só pode ser espontânea ou não é caridade. Decretá-la é o mesmo que aniquilá-la. Se a fraternidade suscita vivamente a nossa simpatia é justamente porque atua fora de toda coação legal. Se a lei raramente pode forçar o homem a ser justo, jamais conseguiria forçá-lo a ser abnegado.

Quando a caridade é livre, espontânea e voluntária, a concebemos e aplaudimos. Admiramos tanto mais o sacrifício que é mais completo. Mas quando se propõe a uma sociedade o princípio de que a fraternidade será imposta pela lei, vale dizer, que a repartição dos frutos do trabalho será feita legislativa e arbitrariamente, sem consideração pelos direitos inerentes ao próprio trabalho, quem pode dizer em que medida este princípio atuará? De que forma um mero capricho do legislador não poderá subvertê-lo?

Quando se admite, como regra geral, que o Estado estará encarregado de fazer a fraternidade em favor dos cidadãos, não é difícil antever que todos serão transformados em suplicantes. Que todos se agitarão para reclamar os favores do Estado. Todos terão boas razões para provar que a caridade legal deve ser entendida no seguinte sentido: "as vantagens para mim e as cargas para os outros". O esforço de cada um será no sentido de arrancar do legislador um fragmento do privilégio "fraternal". Por certo, as classes menos favorecidas, ainda que tenham os maiores títulos, não terão sempre os maiores êxitos.

Se fosse possível decretar a fraternidade universal; se, como querem muitos, conseguíssemos fazer desaparecer do mundo, por um mero estalar de dedos, o interesse pessoal; se fosse possível estabelecer que não haveria mais egoísmo; se pudéssemos operar o milagre de fazer com que o Estado desse tudo a todos, sem tomar nada de ninguém, que se fizesse, então. Quem não se regozijaria de que a humanidade chegasse à perfeição e à felicidade por um caminho tão curto e tão fácil?

Quem não gostaria de jogar sobre as costas do Estado a subsistência, o bem-estar e a educação de todos? De transformar o Estado nesse ser generoso, criativo, presente em tudo, abnegado em tudo, capaz de amamentar a infância, instruir a juventude, assegurar trabalho aos fortes, dar retiro aos débeis, que pudesse intervir diretamente para aliviar todos os sofrimentos, satisfazer e prevenir todas as necessidades, abastecer de capitais a todas as empresas, de luzes a todas as inteligências, de bálsamo a todas as feridas, de asilo a todos os infortunados?

Quem não gostaria de ver todos esses benefícios fluir da lei como uma fonte inesgotável? Quem não estaria feliz de ver o Estado assumir sobre si toda a pena, toda previsão, toda responsabilidade, todo dever, tudo isto que a providência, cujos desígnios são impenetráveis, colocou de laborioso e pesado a cargo da humanidade, e reservar aos indivíduos de que ela se compõe o lado atrativo e fácil; as satisfações, as certezas, a calma, o repouso; um presente sempre seguro, um futuro sempre sorridente, a fortuna sem cuidados, a família sem cargas, o crédito sem garantias, a existência sem esforços?

Certamente quereríamos tudo isso, se fosse possível. Mas, será possível? Eis a questão. Cremos que existe nesta personificação do Estado a mais estranha e a mais humilhante das mistificações. Que seria então este Ente que toma a seu cargo todas as virtudes, todos os deveres, todas as liberalidades? De onde sacaria seus recursos para derramá-los em benefícios sobre os indivíduos? Não seria dos próprios indivíduos? Como poderiam estes recursos multiplicarem-se passando pelas mãos de um intermediário parasitário e voraz? Não é claro que esse mecanismo é de natureza que absorve muito das forças úteis e reduz muito a parte dos trabalhadores?

A caridade implica sempre a idéia de abnegação, de sacrifício, e por isso não se manifesta sem arrancar lágrimas de admiração. Se transformarem a fraternidade numa prescrição legal, cujos atos sejam previstos e obrigatórios, que restará desta definição? Nada mais que uma coisa: o sacrifício, mas o sacrifício involuntário, forçado, determinado pelo medo do castigo. E, de boa fé, que seria um sacrifício desta natureza, imposto a uns em proveito de outros? Seria caridade? Não, seria injustiça, seria espoliação legal, a pior das espoliações, posto que sistemática, permanente e inevitável.

Será necessário tantas explicações para demonstrar que, quando os homens não têm mais a certeza de desfrutar do fruto de seu trabalho, simplesmente não trabalham ou trabalham menos? Para fazer ver que o sacrifício imposto a alguns em favor de outros, por operação dos impostos, perde o caráter de fraternidade?

Eis então a síntese de toda a nossa controvérsia com os socialistas, marxistas, comunistas e demais esquerdistas. Enquanto eles buscam o ideal utópico da sociedade perfeita nos inúmeros planos e esquemas artificiais que pretendem fazer com que a lei se imponha sobre os homens, nós, por outro lado, encontramos a harmonia na natureza do homem e das coisas. Simplesmente, não concordamos que se coloque a lei, o imposto e a coação acima da liberdade individual. Não podemos admitir que se tire, de cada trabalhador, o direito universal e inalienável de utilizar os frutos do próprio trabalho da forma que melhor lhe convier.


Grande parte do texto é uma tradução livre e adaptada do artigo "Justiça e Fraternidade", de Frédéric Bastiat (1801-1850), publicado em junho de 1848.


Nota do Editor: João Luiz Mauad é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.

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